|
Capítulo 1
1. Muitos empreenderam compor uma história dos acontecimentos que
se realizaram entre nós,
2. como no-los transmitiram aqueles que foram desde o princípio
testemunhas oculares e que se tornaram ministros da palavra.
3. Também a mim me pareceu bem, depois de haver diligentemente
investigado tudo desde o princípio, escrevê-los para ti segundo a ordem,
excelentíssimo Teófilo,
4. para que conheças a solidez daqueles ensinamentos que tens
recebido.
5. Nos tempos de Herodes, rei da Judéia, houve um sacerdote por
nome Zacarias, da classe de Abias; sua mulher, descendente de Aarão,
chamava-se Isabel.
6. Ambos eram justos diante de Deus e observavam
irrepreensivelmente todos os mandamentos e preceitos do Senhor.
7. Mas não tinham filho, porque Isabel era estéril e ambos de
idade avançada.
8. Ora, exercendo Zacarias diante de Deus as funções de
sacerdote, na ordem da sua classe,
9. coube-lhe por sorte, segundo o costume em uso entre os
sacerdotes, entrar no santuário do Senhor e aí oferecer o perfume.
10. Todo o povo estava de fora, à hora da oferenda do perfume.
11. Apareceu-lhe então um anjo do Senhor, em pé, à direita do
altar do perfume.
12. Vendo-o, Zacarias ficou perturbado, e o temor assaltou-o.
13. Mas o anjo disse-lhe: Não temas, Zacarias, porque foi ouvida
a tua oração: Isabel, tua mulher, dar-te-á um filho, e chamá-lo-ás João.
14. Ele será para ti motivo de gozo e alegria, e muitos se
alegrarão com o seu nascimento;
15. porque será grande diante do Senhor e não beberá vinho nem
cerveja, e desde o ventre de sua mãe será cheio do Espírito Santo;
16. ele converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor, seu
Deus,
17. e irá adiante de Deus com o espírito e poder de Elias para
reconduzir os corações dos pais aos filhos e os rebeldes à sabedoria dos
justos, para preparar ao Senhor um povo bem disposto.
18. Zacarias perguntou ao anjo: Donde terei certeza disto? Pois
sou velho e minha mulher é de idade avançada.
19. O anjo respondeu-lhe: Eu sou Gabriel, que assisto diante de
Deus, e fui enviado para te falar e te trazer esta feliz nova.
20. Eis que ficarás mudo e não poderás falar até o dia em que
estas coisas acontecerem, visto que não deste crédito às minhas
palavras, que se hão de cumprir a seu tempo.
21. No entanto, o povo estava esperando Zacarias; e admirava-se
de ele se demorar tanto tempo no santuário.
22. Ao sair, não lhes podia falar, e compreenderam que tivera no
santuário uma visão. Ele lhes explicava isto por acenos; e permaneceu
mudo.
23. Decorridos os dias do seu ministério, retirou-se para sua
casa.
24. Algum tempo depois Isabel, sua mulher, concebeu; e por cinco
meses se ocultava, dizendo:
25. Eis a graça que o Senhor me fez, quando lançou os olhos sobre
mim para tirar o meu opróbrio dentre os homens.
26. No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma
cidade da Galiléia, chamada Nazaré,
27. a uma virgem desposada com um homem que se chamava José, da
casa de Davi e o nome da virgem era Maria.
28. Entrando, o anjo disse-lhe: Ave, cheia de graça, o Senhor é
contigo.
29. Perturbou-se ela com estas palavras e pôs-se a pensar no que
significaria semelhante saudação.
30. O anjo disse-lhe: Não temas, Maria, pois encontraste graça
diante de Deus.
31. Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome
de Jesus.
32. Ele será grande e chamar-se-á Filho do Altíssimo, e o Senhor
Deus lhe dará o trono de seu pai Davi; e reinará eternamente na casa de
Jacó,
33. e o seu reino não terá fim.
34. Maria perguntou ao anjo: Como se fará isso, pois não conheço
homem?
35. Respondeu-lhe o anjo: O Espírito Santo descerá sobre ti, e a
força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra. Por isso o ente santo
que nascer de ti será chamado Filho de Deus.
36. Também Isabel, tua parenta, até ela concebeu um filho na sua
velhice; e já está no sexto mês aquela que é tida por estéril,
37. porque a Deus nenhuma coisa é impossível.
38. Então disse Maria: Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim
segundo a tua palavra. E o anjo afastou-se dela.
39. Naqueles dias, Maria se levantou e foi às pressas às
montanhas, a uma cidade de Judá.
40. Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel.
41. Ora, apenas Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança
estremeceu no seu seio; e Isabel ficou cheia do Espírito Santo.
42. E exclamou em alta voz: Bendita és tu entre as mulheres e
bendito é o fruto do teu ventre.
43. Donde me vem esta honra de vir a mim a mãe de meu Senhor?
44. Pois assim que a voz de tua saudação chegou aos meus ouvidos,
a criança estremeceu de alegria no meu seio.
45. Bem-aventurada és tu que creste, pois se hão de cumprir as
coisas que da parte do Senhor te foram ditas!
46. E Maria disse: Minha alma glorifica ao Senhor,
47. meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador,
48. porque olhou para sua pobre serva. Por isto, desde agora, me
proclamarão bem-aventurada todas as gerações,
49. porque realizou em mim maravilhas aquele que é poderoso e
cujo nome é Santo.
50. Sua misericórdia se estende, de geração em geração, sobre os
que o temem.
51. Manifestou o poder do seu braço: desconcertou os corações dos
soberbos.
52. Derrubou do trono os poderosos e exaltou os humildes.
53. Saciou de bens os indigentes e despediu de mãos vazias os
ricos.
54. Acolheu a Israel, seu servo, lembrado da sua misericórdia,
55. conforme prometera a nossos pais, em favor de Abraão e sua
posteridade, para sempre.
56. Maria ficou com Isabel cerca de três meses. Depois voltou
para casa.
57. Completando-se para Isabel o tempo de dar à luz, teve um
filho.
58. Os seus vizinhos e parentes souberam que o Senhor lhe
manifestara a sua misericórdia, e congratulavam-se com ela.
59. No oitavo dia, foram circuncidar o menino e o queriam chamar
pelo nome de seu pai, Zacarias.
60. Mas sua mãe interveio: Não, disse ela, ele se chamará João.
61. Replicaram-lhe: Não há ninguém na tua família que se chame
por este nome.
62. E perguntavam por acenos ao seu pai como queria que se
chamasse.
63. Ele, pedindo uma tabuinha, escreveu nela as palavras: João é
o seu nome. Todos ficaram pasmados.
64. E logo se lhe abriu a boca e soltou-se-lhe a língua e ele
falou, bendizendo a Deus.
65. O temor apoderou-se de todos os seus vizinhos; o fato
divulgou-se por todas as montanhas da Judéia.
66. Todos os que o ouviam conservavam-no no coração, dizendo: Que
será este menino? Porque a mão do Senhor estava com ele.
67. Zacarias, seu pai, ficou cheio do Espírito Santo e
profetizou, nestes termos:
68. Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visitou e
resgatou o seu povo,
69. e suscitou-nos um poderoso Salvador, na casa de Davi, seu
servo
70. (como havia anunciado, desde os primeiros tempos, mediante os
seus santos profetas),
71. para nos livrar dos nossos inimigos e das mãos de todos os
que nos odeiam.
72. Assim exerce a sua misericórdia com nossos pais, e se recorda
de sua santa aliança,
73. segundo o juramento que fez a nosso pai Abraão: de nos
conceder que, sem temor,
74. libertados de mãos inimigas, possamos servi-lo
75. em santidade e justiça, em sua presença, todos os dias da
nossa vida.
76. E tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo, porque
precederás o Senhor e lhe prepararás o caminho,
77. para dar ao seu povo conhecer a salvação, pelo perdão dos
pecados.
78. Graças à ternura e misericórdia de nosso Deus, que nos vai
trazer do alto a visita do Sol nascente,
79. que há de iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da
morte e dirigir os nossos passos no caminho da paz.
80. O menino foi crescendo e fortificava-se em espírito, e viveu
nos desertos até o dia em que se apresentou diante de Israel.
Capítulo 2
1. Naqueles tempos apareceu um decreto de César Augusto,
ordenando o recenseamento de toda a terra.
2. Este recenseamento foi feito antes do governo de Quirino, na
Síria.
3. Todos iam alistar-se, cada um na sua cidade.
4. Também José subiu da Galiléia, da cidade de Nazaré, à Judéia,
à Cidade de Davi, chamada Belém, porque era da casa e família de Davi,
5. para se alistar com a sua esposa Maria, que estava grávida.
6. Estando eles ali, completaram-se os dias dela.
7. E deu à luz seu filho primogênito, e, envolvendo-o em faixas,
reclinou-o num presépio; porque não havia lugar para eles na hospedaria.
8. Havia nos arredores uns pastores, que vigiavam e guardavam seu
rebanho nos campos durante as vigílias da noite.
9. Um anjo do Senhor apareceu-lhes e a glória do Senhor refulgiu
ao redor deles, e tiveram grande temor.
10. O anjo disse-lhes: Não temais, eis que vos anuncio uma boa
nova que será alegria para todo o povo:
11. hoje vos nasceu na Cidade de Davi um Salvador, que é o Cristo
Senhor.
12. Isto vos servirá de sinal: achareis um recém-nascido envolto
em faixas e posto numa manjedoura.
13. E subitamente ao anjo se juntou uma multidão do exército
celeste, que louvava a Deus e dizia:
14. Glória a Deus no mais alto dos céus e na terra paz aos
homens, objetos da benevolência (divina).
15. Depois que os anjos os deixaram e voltaram para o céu,
falaram os pastores uns com os outros: Vamos até Belém e vejamos o que
se realizou e o que o Senhor nos manifestou.
16. Foram com grande pressa e acharam Maria e José, e o menino
deitado na manjedoura.
17. Vendo-o, contaram o que se lhes havia dito a respeito deste
menino.
18. Todos os que os ouviam admiravam-se das coisas que lhes
contavam os pastores.
19. Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu
coração.
20. Voltaram os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo
o que tinham ouvido e visto, e que estava de acordo com o que lhes fora
dito.
21. Completados que foram os oito dias para ser circuncidado o
menino, foi-lhe posto o nome de Jesus, como lhe tinha chamado o anjo,
antes de ser concebido no seio materno.
22. Concluídos os dias da sua purificação segundo a Lei de
Moisés, levaram-no a Jerusalém para o apresentar ao Senhor,
23. conforme o que está escrito na lei do Senhor: Todo
primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor (Ex 13,2);
24. e para oferecerem o sacrifício prescrito pela lei do Senhor,
um par de rolas ou dois pombinhos.
25. Ora, havia em Jerusalém um homem chamado Simeão. Este homem,
justo e piedoso, esperava a consolação de Israel, e o Espírito Santo
estava nele.
26. Fora-lhe revelado pelo Espírito Santo que não morreria sem
primeiro ver o Cristo do Senhor.
27. Impelido pelo Espírito Santo, foi ao templo. E tendo os pais
apresentado o menino Jesus, para cumprirem a respeito dele os preceitos
da lei,
28. tomou-o em seus braços e louvou a Deus nestes termos:
29. Agora, Senhor, deixai o vosso servo ir em paz, segundo a
vossa palavra.
30. Porque os meus olhos viram a vossa salvação
31. que preparastes diante de todos os povos,
32. como luz para iluminar as nações, e para a glória de vosso
povo de Israel.
33. Seu pai e sua mãe estavam admirados das coisas que dele se
diziam.
34. Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua mãe: Eis que este
menino está destinado a ser uma causa de queda e de soerguimento para
muitos homens em Israel, e a ser um sinal que provocará contradições,
35. a fim de serem revelados os pensamentos de muitos corações. E
uma espada transpassará a tua alma.
36. Havia também uma profetisa chamada Ana, filha de Fanuel, da
tribo de Aser; era de idade avançada.
37. Depois de ter vivido sete anos com seu marido desde a sua
virgindade, ficara viúva, e agora com oitenta e quatro anos não se
apartava do templo, servindo a Deus noite e dia em jejuns e orações.
38. Chegando ela à mesma hora, louvava a Deus e falava de Jesus a
todos aqueles que em Jerusalém esperavam a libertação.
39. Após terem observado tudo segundo a lei do Senhor, voltaram
para a Galiléia, à sua cidade de Nazaré.
40. O menino ia crescendo e se fortificava: estava cheio de
sabedoria, e a graça de Deus repousava nele.
41. Seus pais iam todos os anos a Jerusalém para a festa da
Páscoa.
42. Tendo ele atingido doze anos, subiram a Jerusalém, segundo o
costume da festa.
43. Acabados os dias da festa, quando voltavam, ficou o menino
Jesus em Jerusalém, sem que os seus pais o percebessem.
44. Pensando que ele estivesse com os seus companheiros de
comitiva, andaram caminho de um dia e o buscaram entre os parentes e
conhecidos.
45. Mas não o encontrando, voltaram a Jerusalém, à procura dele.
46. Três dias depois o acharam no templo, sentado no meio dos
doutores, ouvindo-os e interrogando-os.
47. Todos os que o ouviam estavam maravilhados da sabedoria de
suas respostas.
48. Quando eles o viram, ficaram admirados. E sua mãe disse-lhe:
Meu filho, que nos fizeste?! Eis que teu pai e eu andávamos à tua
procura, cheios de aflição.
49. Respondeu-lhes ele: Por que me procuráveis? Não sabíeis que
devo ocupar-me das coisas de meu Pai?
50. Eles, porém, não compreenderam o que ele lhes dissera.
51. Em seguida, desceu com eles a Nazaré e lhes era submisso. Sua
mãe guardava todas estas coisas no seu coração.
52. E Jesus crescia em estatura, em sabedoria e graça, diante de
Deus e dos homens.
Capítulo 3
1. No ano décimo quinto do reinado do imperador Tibério, sendo
Pôncio Pilatos governador da Judéia, Herodes tetrarca da Galiléia, seu
irmão Filipe tetrarca da Ituréia e da província de Traconites, e
Lisânias tetrarca da Abilina,
2. sendo sumos sacerdotes Anás e Caifás, veio a palavra do Senhor
no deserto a João, filho de Zacarias.
3. Ele percorria toda a região do Jordão, pregando o batismo de
arrependimento para remissão dos pecados,
4. como está escrito no livro das palavras do profeta Isaías
(40,3ss.): Uma voz clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor,
endireitai as suas veredas.
5. Todo vale será aterrado, e todo monte e outeiro serão
arrasados; tornar-se-á direito o que estiver torto, e os caminhos
escabrosos serão aplainados.
6. Todo homem verá a salvação de Deus.
7. Dizia, pois, ao povo que vinha para ser batizado por ele: Raça
de víboras! Quem vos ensinou a fugir da ira iminente?
8. Fazei, pois, uma conversão realmente frutuosa e não comeceis a
dizer: Temos Abraão por pai. Pois vos digo: Deus tem poder para destas
pedras suscitar filhos a Abraão.
9. O machado já está posto à raiz das árvores. E toda árvore que
não der fruto bom será cortada e lançada ao fogo.
10. Perguntava-lhe a multidão: Que devemos fazer?
11. Ele respondia: Quem tem duas túnicas dê uma ao que não tem; e
quem tem o que comer, faça o mesmo.
12. Também publicanos vieram para ser batizados, e
perguntaram-lhe: Mestre, que devemos fazer?
13. Ele lhes respondeu: Não exijais mais do que vos foi ordenado.
14. Do mesmo modo, os soldados lhe perguntavam: E nós, que
devemos fazer? Respondeu-lhes: Não pratiqueis violência nem defraudeis a
ninguém, e contentai-vos com o vosso soldo.
15. Ora, como o povo estivesse na expectativa, e como todos
perguntassem em seus corações se talvez João fosse o Cristo,
16. ele tomou a palavra, dizendo a todos: Eu vos batizo na água,
mas eis que vem outro mais poderoso do que eu, a quem não sou digno de
lhe desatar a correia das sandálias; ele vos batizará no Espírito Santo
e no fogo.
17. Ele tem a pá na mão e limpará a sua eira, e recolherá o trigo
ao seu celeiro, mas queimará as palhas num fogo inextinguível.
18. É assim que ele anunciava ao povo a boa nova, e dirigia-lhe
ainda muitas outras exortações.
19. Mas Herodes, o tetrarca, repreendido por ele por causa de
Herodíades, mulher de seu irmão, e por causa de todos os crimes que
praticara,
20. acrescentou a todos eles também este: encerrou João no
cárcere.
21. Quando todo o povo ia sendo batizado, também Jesus o foi. E
estando ele a orar, o céu se abriu
22. e o Espírito Santo desceu sobre ele em forma corpórea, como
uma pomba; e veio do céu uma voz: Tu és o meu Filho bem-amado; em ti
ponho minha afeição.
23. Quando Jesus começou o seu ministério, tinha cerca de trinta
anos, e era tido por filho de José, filho de Heli, filho de Matat,
24. filho de Levi, filho de Melqui, filho de Jané, filho de José,
25. filho de Matatias, filho de Amós, filho de Naum, filho de
Hesli, filho de Nagé,
26. filho de Maat, filho de Matatias, filho de Semei, filho de
José, filho de Judá,
27. filho de Joanã, filho de Resa, filho de Zorobabel, filho de
Salatiel, filho de Neri,
28. filho de Melqui, filho de Adi, filho de Cosã, filho de
Elmadão, filho de Her,
29. filho de Jesus, filho de Eliezer, filho de Jorim, filho de
Matat, filho de Levi,
30. filho de Simeão, filho de Judá, filho de José, filho de
Jonão, filho de Eliacim,
31. filho de Meléia, filho de Mena, filho de Matata, filho de
Natã, filho de Davi,
32. filho de Jessé, filho de Obed, filho de Booz, filho de
Salmon, filho de Naason,
33. filho de Aminadab, filho de Arão, filho de Esron, filho de
Farés, filho de Judá,
34. filho de Jacó, filho de Isaac, filho de Abraão, filho de
Taré, filho de Nacor,
35. filho de Sarug, filho de Ragau, filho de Faleg, filho de
Eber, filho de Salé,
36. filho de Cainã, filho de Arfaxad, filho de Sem, filho de Noé,
filho de Lamec,
37. filho de Matusalém, filho de Henoc, filho de Jared, filho de
Malaleel, filho de Cainã,
38. filho de Henós, filho de Set, filho de Adão, filho de Deus.
Capítulo 4
1. Cheio do Espírito Santo, voltou Jesus do Jordão e foi levado
pelo Espírito ao deserto,
2. onde foi tentado pelo demônio durante quarenta dias. Durante
este tempo ele nada comeu e, terminados estes dias, teve fome.
3. Disse-lhe então o demônio: Se és o Filho de Deus, ordena a
esta pedra que se torne pão.
4. Jesus respondeu: Está escrito: Não só de pão vive o homem, mas
de toda a palavra de Deus (Dt 8,3).
5. O demônio levou-o em seguida a um alto monte e mostrou-lhe num
só momento todos os reinos da terra,
6. e disse-lhe: Dar-te-ei todo este poder e a glória desses
reinos, porque me foram dados, e dou-os a quem quero.
7. Portanto, se te prostrares diante de mim, tudo será teu.
8. Jesus disse-lhe: Está escrito: Adorarás o Senhor teu Deus, e a
ele só servirás (Dt 6,13).
9. O demônio levou-o ainda a Jerusalém, ao ponto mais alto do
templo, e disse-lhe: Se és o Filho de Deus, lança-te daqui abaixo;
10. porque está escrito: Ordenou aos seus anjos a teu respeito
que te guardassem.
11. E que te sustivessem em suas mãos, para não ferires o teu pé
nalguma pedra (Sl 90,11s.).
12. Jesus disse: Foi dito: Não tentarás o Senhor teu Deus (Dt
6,16).
13. Depois de tê-lo assim tentado de todos os modos, o demônio
apartou-se dele até outra ocasião.
14. Jesus então, cheio da força do Espírito, voltou para a
Galiléia. E a sua fama divulgou-se por toda a região.
15. Ele ensinava nas sinagogas e era aclamado por todos.
16. Dirigiu-se a Nazaré, onde se havia criado. Entrou na sinagoga
em dia de sábado, segundo o seu costume, e levantou-se para ler.
17. Foi-lhe dado o livro do profeta Isaías. Desenrolando o livro,
escolheu a passagem onde está escrito (61,1s.):
18. O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu; e
enviou-me para anunciar a boa nova aos pobres, para sarar os contritos
de coração,
19. para anunciar aos cativos a redenção, aos cegos a restauração
da vista, para pôr em liberdade os cativos, para publicar o ano da graça
do Senhor.
20. E enrolando o livro, deu-o ao ministro e sentou-se; todos
quantos estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele.
21. Ele começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu este oráculo que
vós acabais de ouvir.
22. Todos lhe davam testemunho e se admiravam das palavras de
graça, que procediam da sua boca, e diziam: Não é este o filho de José?
23. Então lhes disse: Sem dúvida me citareis este provérbio:
Médico, cura-te a ti mesmo; todas as maravilhas que fizeste em
Cafarnaum, segundo ouvimos dizer, faze-o também aqui na tua pátria.
24. E acrescentou: Em verdade vos digo: nenhum profeta é bem
aceito na sua pátria.
25. Em verdade vos digo: muitas viúvas havia em Israel, no tempo
de Elias, quando se fechou o céu por três anos e meio e houve grande
fome por toda a terra;
26. mas a nenhuma delas foi mandado Elias, senão a uma viúva em
Sarepta, na Sidônia.
27. Igualmente havia muitos leprosos em Israel, no tempo do
profeta Eliseu; mas nenhum deles foi limpo, senão o sírio Naamã.
28. A estas palavras, encheram-se todos de cólera na sinagoga.
29. Levantaram-se e lançaram-no fora da cidade; e conduziram-no
até o alto do monte sobre o qual estava construída a sua cidade, e
queriam precipitá-lo dali abaixo.
30. Ele, porém, passou por entre eles e retirou-se.
31. Desceu a Cafarnaum, cidade da Galiléia, e ali ensinava-os aos
sábados.
32. Maravilharam-se da sua doutrina, porque ele ensinava com
autoridade.
33. Estava na sinagoga um homem que tinha um demônio imundo, e
exclamou em alta voz:
34. Deixa-nos! Que temos nós contigo, Jesus de Nazaré? Vieste
para nos perder? Sei quem és: o Santo de Deus!
35. Mas Jesus replicou severamente: Cala-te e sai deste homem. O
demônio lançou-o por terra no meio de todos e saiu dele, sem lhe fazer
mal algum.
36. Todos ficaram cheios de pavor e falavam uns com os outros:
Que significa isso? Manda com poder e autoridade aos espíritos imundos,
e eles saem?
37. E corria a sua fama por todos os lugares da circunvizinhança.
38. Saindo Jesus da sinagoga, entrou na casa de Simão. A sogra de
Simão estava com febre alta; e pediram-lhe por ela.
39. Inclinando-se sobre ela, ordenou ele à febre, e a febre
deixou-a. Ela levantou-se imediatamente e pôs-se a servi-los.
40. Depois do pôr-do-sol, todos os que tinham enfermos de
diversas moléstias lhos traziam. Impondo-lhes a mão, os sarava.
41. De muitos saíam os demônios, aos gritos, dizendo: Tu és o
Filho de Deus. Mas ele repreendia-os severamente, não lhes permitindo
falar, porque sabiam que ele era o Cristo.
42. Ao amanhecer, ele saiu e retirou-se para um lugar afastado.
As multidões o procuravam e foram até onde ele estava e queriam detê-lo,
para que não as deixasse.
43. Mas ele disse-lhes: É necessário que eu anuncie a boa nova do
Reino de Deus também às outras cidades, pois essa é a minha missão.
44. E andava pregando nas sinagogas da Galiléia.
Capítulo 5
1. Estando Jesus um dia à margem do lago de Genesaré, o povo se
comprimia em redor dele para ouvir a palavra de Deus.
2. Vendo duas barcas estacionadas à beira do lago, - pois os
pescadores haviam descido delas para consertar as redes -,
3. subiu a uma das barcas que era de Simão e pediu-lhe que a
afastasse um pouco da terra; e sentado, ensinava da barca o povo.
4. Quando acabou de falar, disse a Simão: Faze-te ao largo, e
lançai as vossas redes para pescar.
5. Simão respondeu-lhe: Mestre, trabalhamos a noite inteira e
nada apanhamos; mas por causa de tua palavra, lançarei a rede.
6. Feito isto, apanharam peixes em tanta quantidade, que a rede
se lhes rompia.
7. Acenaram aos companheiros, que estavam na outra barca, para
que viessem ajudar. Eles vieram e encheram ambas as barcas, de modo que
quase iam ao fundo.
8. Vendo isso, Simão Pedro caiu aos pés de Jesus e exclamou:
Retira-te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador.
9. É que tanto ele como seus companheiros estavam assombrados por
causa da pesca que haviam feito.
10. O mesmo acontecera a Tiago e João, filhos de Zebedeu, que
eram seus companheiros. Então Jesus disse a Simão: Não temas; doravante
serás pescador de homens.
11. E atracando as barcas à terra, deixaram tudo e o seguiram.
12. Estando ele numa cidade, apareceu um homem cheio de lepra.
Vendo Jesus, lançou-se com o rosto por terra e lhe suplicou: Senhor, se
queres, podes limpar-me.
13. Jesus estendeu a mão, tocou-o e disse: Eu quero; sê
purificado! No mesmo instante desapareceu dele a lepra.
14. Ordenou-lhe Jesus que o não contasse a ninguém, dizendo-lhe,
porém: Vai e mostra-te ao sacerdote, e oferece pela tua purificação o
que Moisés prescreveu, para lhes servir de testemunho.
15. Entretanto, espalhava-se mais e mais a sua fama e concorriam
grandes multidões para o ouvir e ser curadas das suas enfermidades.
16. Mas ele costumava retirar-se a lugares solitários para orar.
17. Um dia estava ele ensinando. Ao seu derredor estavam sentados
fariseus e doutores da lei, vindos de todas as localidades da Galiléia,
da Judéia e de Jerusalém. E o poder do Senhor fazia-o realizar várias
curas.
18. Apareceram algumas pessoas trazendo num leito um homem
paralítico; e procuravam introduzi-lo na casa e pô-lo diante dele.
19. Mas não achando por onde o introduzir, por causa da multidão,
subiram ao telhado e por entre as telhas o arriaram com o leito ao meio
da assembléia, diante de Jesus.
20. Vendo a fé que tinham, disse Jesus: Meu amigo, os teus
pecados te são perdoados.
21. Então os escribas e os fariseus começaram a pensar e a dizer
consigo mesmos: Quem é este homem que profere blasfêmias? Quem pode
perdoar pecados senão unicamente Deus?
22. Jesus, porém, penetrando nos seus pensamentos, replicou-lhes:
Que pensais nos vossos corações?
23. Que é mais fácil dizer: Perdoados te são os pecados; ou
dizer: Levanta-te e anda?
24. Ora, para que saibais que o Filho do Homem tem na terra poder
de perdoar pecados (disse ele ao paralítico), eu te ordeno: levanta-te,
toma o teu leito e vai para tua casa.
25. No mesmo instante, levantou-se ele à vista deles, tomou o
leito e partiu para casa, glorificando a Deus.
26. Todos ficaram transportados de entusiasmo e glorificavam a
Deus; e tomados de temor, diziam: Hoje vimos coisas maravilhosas.
27. Depois disso, ele saiu e viu sentado ao balcão um coletor de
impostos, por nome Levi, e disse-lhe: Segue-me.
28. Deixando ele tudo, levantou-se e o seguiu.
29. Levi deu-lhe um grande banquete em sua casa; vários desses
fiscais e outras pessoas estavam sentados à mesa com eles.
30. Os fariseus e os seus escribas puseram-se a criticar e a
perguntar aos discípulos: Por que comeis e bebeis com os publicanos e
pessoas de má vida?
31. Respondeu-lhes Jesus: Não são os homens de boa saúde que
necessitam de médico, mas sim os enfermos.
32. Não vim chamar à conversão os justos, mas sim os pecadores.
33. Eles então lhe disseram: Os discípulos de João e os
discípulos dos fariseus jejuam com freqüência e fazem longas orações,
mas os teus comem e bebem...
34. Jesus respondeu-lhes: Porventura podeis vós obrigar a jejuar
os amigos do esposo, enquanto o esposo está com eles?
35. Virão dias em que o esposo lhes será tirado; então jejuarão.
36. Propôs-lhes também esta comparação: Ninguém rasga um pedaço
de roupa nova para remendar uma roupa velha, porque assim estragaria uma
roupa nova. Além disso, o remendo novo não assentaria bem na roupa velha.
37. Também ninguém põe vinho novo em odres velhos; do contrário,
o vinho novo arrebentará os odres e entornar-se-á, e perder-se-ão os
odres;
38. mas o vinho novo deve-se pôr em odres novos, e assim ambos se
conservam.
39. Demais, ninguém que bebeu do vinho velho quer já do novo,
porque diz: O vinho velho é melhor.
Capítulo 6
1. Em dia de sábado, Jesus atravessava umas plantações; seus
discípulos iam colhendo espigas (de trigo), as debulhavam na mão e
comiam.
2. Alguns dos fariseus lhes diziam: Por que fazeis o que não é
permitido no sábado?
3. Jesus respondeu: Acaso não tendes lido o que fez Davi, quando
teve fome, ele e os seus companheiros;
4. como entrou na casa de Deus e tomou os pães da proposição e
deles comeu e deu de comer aos seus companheiros, se bem que só aos
sacerdotes era permitido comê-los?
5. E ajuntou: O Filho do Homem é senhor também do sábado.
6. Em outro dia de sábado, Jesus entrou na sinagoga e ensinava.
Achava-se ali um homem que tinha a mão direita seca.
7. Ora, os escribas e os fariseus observavam Jesus para ver se
ele curaria no dia de sábado. Eles teriam então pretexto para acusá-lo.
8. Mas Jesus conhecia os pensamentos deles e disse ao homem que
tinha a mão seca: Levanta-te e põe-te em pé, aqui no meio. Ele se
levantou e ficou em pé.
9. Disse-lhes Jesus: Pergunto-vos se no sábado é permitido fazer
o bem ou o mal; salvar a vida, ou deixá-la perecer.
10. E relanceando os olhos sobre todos, disse ao homem: Estende
tua mão. Ele a estendeu, e foi-lhe restabelecida a mão.
11. Mas eles encheram-se de furor e indagavam uns aos outros o
que fariam a Jesus.
12. Naqueles dias, Jesus retirou-se a uma montanha para rezar, e
passou aí toda a noite orando a Deus.
13. Ao amanhecer, chamou os seus discípulos e escolheu doze
dentre eles que chamou de apóstolos:
14. Simão, a quem deu o sobrenome de Pedro; André, seu irmão;
Tiago, João, Filipe, Bartolomeu,
15. Mateus, Tomé, Tiago, filho de Alfeu; Simão, chamado Zelador;
16. Judas, irmão de Tiago; e Judas Iscariotes, aquele que foi o
traidor.
17. Descendo com eles, parou numa planície. Aí se achava um
grande número de seus discípulos e uma grande multidão de pessoas vindas
da Judéia, de Jerusalém, da região marítima, de Tiro e Sidônia, que
tinham vindo para ouvi-lo e ser curadas das suas enfermidades.
18. E os que eram atormentados dos espíritos imundos ficavam
livres.
19. Todo o povo procurava tocá-lo, pois saía dele uma força que
os curava a todos.
20. Então ele ergueu os olhos para os seus discípulos e disse:
Bem-aventurados vós que sois pobres, porque vosso é o Reino de Deus!
21. Bem-aventurados vós que agora tendes fome, porque sereis
fartos! Bem-aventurados vós que agora chorais, porque vos alegrareis!
22. Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem, vos
expulsarem, vos ultrajarem, e quando repelirem o vosso nome como infame
por causa do Filho do Homem!
23. Alegrai-vos naquele dia e exultai, porque grande é o vosso
galardão no céu. Era assim que os pais deles tratavam os profetas.
24. Mas ai de vós, ricos, porque tendes a vossa consolação!
25. Ai de vós, que estais fartos, porque vireis a ter fome! Ai de
vós, que agora rides, porque gemereis e chorareis!
26. Ai de vós, quando vos louvarem os homens, porque assim faziam
os pais deles aos falsos profetas!
27. Digo-vos a vós que me ouvis: amai os vossos inimigos, fazei
bem aos que vos odeiam,
28. abençoai os que vos maldizem e orai pelos que vos injuriam.
29. Ao que te ferir numa face, oferece-lhe também a outra. E ao
que te tirar a capa, não impeças de levar também a túnica.
30. Dá a todo o que te pedir; e ao que tomar o que é teu, não lho
reclames.
31. O que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles.
32. Se amais os que vos amam, que recompensa mereceis? Também os
pecadores amam aqueles que os amam.
33. E se fazeis bem aos que vos fazem bem, que recompensa
mereceis? Pois o mesmo fazem também os pecadores.
34. Se emprestais àqueles de quem esperais receber, que
recompensa mereceis? Também os pecadores emprestam aos pecadores, para
receberem outro tanto.
35. Pelo contrário, amai os vossos inimigos, fazei bem e
emprestai, sem daí esperar nada. E grande será a vossa recompensa e
sereis filhos do Altíssimo, porque ele é bom para com os ingratos e maus.
36. Sede misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso.
37. Não julgueis, e não sereis julgados; não condeneis, e não
sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados;
38. dai, e dar-se-vos-á. Colocar-vos-ão no regaço medida boa,
cheia, recalcada e transbordante, porque, com a mesma medida com que
medirdes, sereis medidos vós também.
39. Propôs-lhes também esta comparação: Pode acaso um cego guiar
outro cego? Não cairão ambos na cova?
40. O discípulo não é superior ao mestre; mas todo discípulo
perfeito será como o seu mestre.
41. Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão e não reparas
na trave que está no teu olho?
42. Ou como podes dizer a teu irmão: Deixa-me, irmão, tirar de
teu olho o argueiro, quando tu não vês a trave no teu olho? Hipócrita,
tira primeiro a trave do teu olho e depois enxergarás para tirar o
argueiro do olho de teu irmão.
43. Uma árvore boa não dá frutos maus, uma árvore má não dá bom
fruto.
44. Porquanto cada árvore se conhece pelo seu fruto. Não se
colhem figos dos espinheiros, nem se apanham uvas dos abrolhos.
45. O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração, e
o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, porque a boca fala
daquilo de que o coração está cheio.
46. Por que me chamais: Senhor, Senhor... e não fazeis o que digo?
47. Todo aquele que vem a mim ouve as minhas palavras e as
pratica, eu vos mostrarei a quem é semelhante.
48. É semelhante ao homem que, edificando uma casa, cavou bem
fundo e pôs os alicerces sobre a rocha. As águas transbordaram,
precipitaram-se as torrentes contra aquela casa e não a puderam abalar,
porque ela estava bem construída.
49. Mas aquele que as ouve e não as observa é semelhante ao homem
que construiu a sua casa sobre a terra movediça, sem alicerces. A
torrente investiu contra ela, e ela logo ruiu; e grande foi a ruína
daquela casa.
Capítulo 7
1. Tendo Jesus concluído todos os seus discursos ao povo que o
escutava, entrou em Cafarnaum.
2. Havia lá um centurião que tinha um servo a quem muito estimava
e que estava à morte.
3. Tendo ouvido falar de Jesus, enviou-lhe alguns anciãos dos
judeus, rogando-lhe que o viesse curar.
4. Aproximando-se eles de Jesus, rogavam-lhe encarecidamente: Ele
bem merece que lhe faças este favor,
5. pois é amigo da nossa nação e foi ele mesmo quem nos edificou
uma sinagoga.
6. Jesus então foi com eles. E já não estava longe da casa,
quando o centurião lhe mandou dizer por amigos seus: Senhor, não te
incomodes tanto assim, porque não sou digno de que entres em minha casa;
7. por isso nem me achei digno de chegar-me a ti, mas dize
somente uma palavra e o meu servo será curado.
8. Pois também eu, simples subalterno, tenho soldados às minhas
ordens; e digo a um: Vai ali! E ele vai; e a outro: Vem cá! E ele vem; e
ao meu servo: Faze isto! E ele o faz.
9. Ouvindo estas palavras, Jesus ficou admirado. E, voltando-se
para o povo que o ia seguindo, disse: Em verdade vos digo: nem mesmo em
Israel encontrei tamanha fé.
10. Voltando para a casa do centurião os que haviam sido enviados,
encontraram o servo curado.
11. No dia seguinte dirigiu-se Jesus a uma cidade chamada Naim.
Iam com ele diversos discípulos e muito povo.
12. Ao chegar perto da porta da cidade, eis que levavam um
defunto a ser sepultado, filho único de uma viúva; acompanhava-a muita
gente da cidade.
13. Vendo-a o Senhor, movido de compaixão para com ela, disse-lhe:
Não chores!
14. E aproximando-se, tocou no esquife, e os que o levavam
pararam. Disse Jesus: Moço, eu te ordeno, levanta-te.
15. Sentou-se o que estivera morto e começou a falar, e Jesus
entregou-o à sua mãe.
16. Apoderou-se de todos o temor, e glorificavam a Deus, dizendo:
Um grande profeta surgiu entre nós: Deus voltou os olhos para o seu povo.
17. A notícia deste fato correu por toda a Judéia e por toda a
circunvizinhança.
18. Os discípulos de João referiram-lhe todas estas coisas.
19. E João chamou dois dos seus discípulos e enviou-os a Jesus,
perguntando: És tu o que há de vir ou devemos esperar por outro?
20. Chegando estes homens a ele, disseram: João Batista
enviou-nos a ti, perguntando: És tu o que há de vir ou devemos esperar
por outro?
21. Ora, naquele momento Jesus havia curado muitas pessoas de
enfermidades, de doenças e de espíritos malignos, e dado a vista a
muitos cegos.
22. Respondeu-lhes ele: Ide anunciar a João o que tendes visto e
ouvido: os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos ficam limpos, os
surdos ouvem, os mortos ressuscitam, aos pobres é anunciado o Evangelho;
23. e bem-aventurado é aquele para quem eu não for ocasião de
queda!
24. Depois que se retiraram os mensageiros de João, ele começou a
falar de João ao povo: Que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo
vento?
25. Mas que fostes ver? Um homem vestido de roupas finas? Mas os
que vestem roupas preciosas e vivem no luxo estão nos palácios dos reis.
26. Mas, enfim, que fostes ver? Um profeta? Sim, digo-vos, e mais
do que profeta.
27. Este é aquele de quem está escrito: Eis que envio o meu
mensageiro ante a tua face; ele preparará o teu caminho diante de ti (Ml
3,1).
28. Pois vos digo: entre os nascidos de mulher não há maior que
João. Entretanto, o menor no Reino de Deus é maior do que ele.
29. Ouvindo-o todo o povo, e mesmo os publicanos, deram razão a
Deus, fazendo-se batizar com o batismo de João.
30. Os fariseus, porém, e os doutores da lei, recusando o seu
batismo, frustraram o desígnio de Deus a seu respeito.
31. A quem compararei os homens desta geração? Com quem se
assemelham?
32. São semelhantes a meninos que, sentados na praça, falam uns
com os outros, dizendo: Tocamos a flauta e não dançastes; entoamos
lamentações e não chorastes.
33. Pois veio João Batista, que nem comia pão nem bebia vinho, e
dizeis: Ele está possuído do demônio.
34. Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e dizeis: Eis um
comilão e beberrão, amigo dos publicanos e libertinos.
35. Mas a sabedoria foi justificada por todos os seus filhos.
36. Um fariseu convidou Jesus a ir comer com ele. Jesus entrou na
casa dele e pôs-se à mesa.
37. Uma mulher pecadora da cidade, quando soube que estava à mesa
em casa do fariseu, trouxe um vaso de alabastro cheio de perfume;
38. e, estando a seus pés, por detrás dele, começou a chorar.
Pouco depois suas lágrimas banhavam os pés do Senhor e ela os enxugava
com os cabelos, beijava-os e os ungia com o perfume.
39. Ao presenciar isto, o fariseu, que o tinha convidado, dizia
consigo mesmo: Se este homem fosse profeta, bem saberia quem e qual é a
mulher que o toca, pois é pecadora.
40. Então Jesus lhe disse: Simão, tenho uma coisa a dizer-te.
Fala, Mestre, disse ele.
41. Um credor tinha dois devedores: um lhe devia quinhentos
denários e o outro, cinqüenta.
42. Não tendo eles com que pagar, perdoou a ambos a sua dívida.
Qual deles o amará mais?
43. Simão respondeu: A meu ver, aquele a quem ele mais perdoou.
Jesus replicou-lhe: Julgaste bem.
44. E voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês esta mulher?
Entrei em tua casa e não me deste água para lavar os pés; mas esta, com
as suas lágrimas, regou-me os pés e enxugou-os com os seus cabelos.
45. Não me deste o ósculo; mas esta, desde que entrou, não cessou
de beijar-me os pés.
46. Não me ungiste a cabeça com óleo; mas esta, com perfume,
ungiu-me os pés.
47. Por isso te digo: seus numerosos pecados lhe foram perdoados,
porque ela tem demonstrado muito amor. Mas ao que pouco se perdoa, pouco
ama.
48. E disse a ela: Perdoados te são os pecados.
49. Os que estavam com ele à mesa começaram a dizer, então: Quem
é este homem que até perdoa pecados?
50. Mas Jesus, dirigindo-se à mulher, disse-lhe: Tua fé te salvou;
vai em paz.
Capítulo 8
1. Depois disso, Jesus andava pelas cidades e aldeias anunciando
a boa nova do Reino de Deus.
2. Os Doze estavam com ele, como também algumas mulheres que
tinham sido livradas de espíritos malignos e curadas de enfermidades:
Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete demônios;
3. Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes; Susana e muitas
outras, que o assistiram com as suas posses.
4. Havia se reunido uma grande multidão: eram pessoas vindas de
várias cidades para junto dele. Ele lhes disse esta parábola:
5. Saiu o semeador a semear a sua semente. E ao semear, parte da
semente caiu à beira do caminho; foi pisada, e as aves do céu a comeram.
6. Outra caiu no pedregulho; e, tendo nascido, secou, por falta
de umidade.
7. Outra caiu entre os espinhos; cresceram com ela os espinhos, e
sufocaram-na.
8. Outra, porém, caiu em terra boa; tendo crescido, produziu
fruto cem por um. Dito isto, Jesus acrescentou alteando a voz: Quem tem
ouvidos para ouvir, ouça!
9. Os seus discípulos perguntaram-lhe a significação desta
parábola.
10. Ele respondeu: A vós é concedido conhecer os mistérios do
Reino de Deus, mas aos outros se lhes fala por parábolas; de forma que
vendo não vejam, e ouvindo não entendam.
11. Eis o que significa esta parábola: a semente é a palavra de
Deus.
12. Os que estão à beira do caminho são aqueles que ouvem; mas
depois vem o demônio e lhes tira a palavra do coração, para que não
creiam nem se salvem.
13. Aqueles que a recebem em solo pedregoso são os ouvintes da
palavra de Deus que a acolhem com alegria; mas não têm raiz, porque
crêem até certo tempo, e na hora da provação a abandonam.
14. A que caiu entre os espinhos, estes são os que ouvem a
palavra, mas prosseguindo o caminho, são sufocados pelos cuidados,
riquezas e prazeres da vida, e assim os seus frutos não amadurecem.
15. A que caiu na terra boa são os que ouvem a palavra com
coração reto e bom, retêm-na e dão fruto pela perseverança.
16. Ninguém acende uma lâmpada e a cobre com um vaso ou a põe
debaixo da cama; mas a põe sobre um castiçal, para iluminar os que
entram.
17. Porque não há coisa oculta que não acabe por se manifestar,
nem secreta que não venha a ser descoberta.
18. Vede, pois, como é que ouvis. Porque ao que tiver, lhe será
dado; e ao que não tiver, até aquilo que julga ter lhe será tirado.
19. A mãe e os irmãos de Jesus foram procurá-lo, mas não podiam
chegar-se a ele por causa da multidão.
20. Foi-lhe avisado: Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e
desejam ver-te.
21. Ele lhes disse: Minha mãe e meus irmãos são estes, que ouvem
a palavra de Deus e a observam.
22. Num daqueles dias ele subiu com os seus discípulos a uma
barca. Disse ele: Passemos à outra margem do lago. E eles partiram.
23. Durante a travessia, Jesus adormeceu. Desabou então uma
tempestade de vento sobre o lago. A barca enchia-se de água, e eles se
achavam em perigo.
24. Aproximaram-se dele então e o despertaram com este grito:
Mestre, Mestre! Nós estamos perecendo! Levantou-se ele e ordenou aos
ventos e à fúria da água que se acalmassem; e se acalmaram e logo veio a
bonança. 25 Perguntou-lhes, então: Onde está a vossa fé? Eles, cheios de
respeito e de profunda admiração, diziam uns aos outros: Quem é este, a
quem os ventos e o mar obedecem?
26. Navegaram para a região dos gerasenos, que está defronte da
Galiléia.
27. Mal saltou em terra, veio-lhe ao encontro um homem dessa
região, possuído de muitos demônios; há muito tempo não se vestia nem
parava em casa, mas habitava no cemitério.
28. Ao ver Jesus, prostrou-se diante dele e gritou em alta voz:
Por que te ocupas de mim, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Rogo-te, não
me atormentes!
29. Porque Jesus ordenara ao espírito imundo que saísse do homem.
Pois há muito tempo que se apoderara dele, e guardavam-no preso em
cadeias e com grilhões nos pés, mas ele rompia as cadeias e era impelido
pelo demônio para os desertos.
30. Jesus perguntou-lhe: Qual é o teu nome? Ele respondeu: Legião!
(Porque eram muitos os demônios que nele se ocultavam.)
31. E pediam-lhe que não os mandasse ir para o abismo.
32. Ora, andava ali pastando no monte uma grande manada de porcos;
rogaram-lhe os demônios que lhes permitisse entrar neles. Ele permitiu.
33. Saíram, pois, os demônios do homem e entraram nos porcos; e a
manada de porcos precipitou-se, pelo despenhadeiro, impetuosamente no
lago e afogou-se.
34. Quando aqueles que os guardavam viram o acontecido, fugiram e
foram contá-lo na cidade e pelo campo.
35. Saíram eles, pois, a ver o que havia ocorrido. Chegaram a
Jesus e acharam a seus pés, sentado, vestido e calmo, o homem de quem
haviam sido expulsos os demônios; e tomados de medo,
36. ouviram das testemunhas a narração desse exorcismo.
37. Então todo o povo da região dos gerasenos rogou a Jesus que
se retirasse deles, pois estavam possuídos de grande temor. Jesus subiu
à barca, para regressar.
38. Nesse momento, pedia-lhe o homem, de quem tinham saído os
demônios, para ficar com ele. Mas Jesus despediu-o, dizendo:
39. Volta para casa, e conta quanto Deus te fez. E ele se foi,
publicando por toda a cidade essas grandes coisas...
40. À sua volta, Jesus foi recebido por uma multidão que o
esperava.
41. O chefe da sinagoga, chamado Jairo, foi ao seu encontro.
Lançou-se a seus pés e rogou-lhe que fosse à sua casa,
42. porque tinha uma filha única, de uns doze anos, que estava
para morrer. Jesus dirigiu-se para lá, comprimido pelo povo.
43. Ora, uma mulher que padecia dum fluxo de sangue havia doze
anos, e tinha gasto com médicos todos os seus bens, sem que nenhum a
pudesse curar,
44. aproximou-se dele por detrás e tocou-lhe a orla do manto; e
no mesmo instante lhe parou o fluxo de sangue.
45. Jesus perguntou: Quem foi que me tocou? Como todos negassem,
Pedro e os que com ele estavam disseram: Mestre, a multidão te aperta de
todos os lados...
46. Jesus replicou: Alguém me tocou, porque percebi sair de mim
uma força.
47. A mulher viu-se descoberta e foi tremendo e prostrou-se aos
seus pés; e declarou diante de todo o povo o motivo por que o havia
tocado, e como logo ficara curada.
48. Jesus disse-lhe: Minha filha, tua fé te salvou; vai em paz.
49. Enquanto ainda falava, veio alguém e disse ao chefe da
sinagoga: Tua filha acaba de morrer; não incomodes mais o Mestre.
50. Mas Jesus o ouviu e disse a Jairo: Não temas; crê somente e
ela será salva.
51. Quando Jesus chegou à casa, não deixou ninguém entrar com ele,
senão Pedro, Tiago, João com o pai e a mãe da menina.
52. Todos, entretanto, choravam e se lamentavam. Mas Jesus disse:
Não choreis; a menina não morreu, mas dorme.
53. Zombavam dele, pois sabiam bem que estava morta.
54. Mas segurando ele a mão dela, disse em alta voz: Menina,
levanta-te!
55. Voltou-lhe a vida e ela levantou-se imediatamente. Jesus
mandou que lhe dessem de comer.
56. Seus pais ficaram tomados de pasmo; Jesus ordenou-lhes que
não contassem a pessoa alguma o que se tinha passado.
Capítulo 9
1. Reunindo Jesus os doze apóstolos, deu-lhes poder e autoridade
sobre todos os demônios, e para curar enfermidades.
2. Enviou-os a pregar o Reino de Deus e a curar os enfermos.
3. Disse-lhes: Não leveis coisa alguma para o caminho, nem bordão,
nem mochila, nem pão, nem dinheiro, nem tenhais duas túnicas.
4. Em qualquer casa em que entrardes, ficai ali até que deixeis
aquela localidade.
5. Onde ninguém vos receber, deixai aquela cidade e em testemunho
contra eles sacudi a poeira dos vossos pés.
6. Partiram, pois, e percorriam as aldeias, pregando o Evangelho
e fazendo curas por toda parte.
7. O tetrarca Herodes ouviu falar de tudo o que Jesus fazia e
ficou perplexo. Uns diziam: É João que ressurgiu dos mortos; outros: É
Elias que apareceu;
8. e ainda outros: É um dos antigos profetas que ressuscitou.
9. Mas Herodes dizia: Eu degolei João. Quem é, pois, este, de
quem ouço tais coisas? E procurava ocasião de vê-lo.
10. Os apóstolos, ao voltarem, contaram a Jesus tudo o que haviam
feito. Tomando-os ele consigo à parte, dirigiu-se a um lugar deserto
para o lado de Betsaida.
11. Logo que a multidão o soube, o foi seguindo; Jesus recebeu-os
e falava-lhes do Reino de Deus. Restabelecia também a saúde dos doentes.
12. Ora, o dia começava a declinar e os Doze foram dizer-lhe:
Despede as turbas, para que vão pelas aldeias e sítios da vizinhança e
procurem alimento e hospedagem, porque aqui estamos num lugar deserto.
13. Jesus replicou-lhes: Dai-lhes vós mesmos de comer. Retrucaram
eles: Não temos mais do que cinco pães e dois peixes, a menos que nós
mesmos vamos e compremos mantimentos para todo este povo.
14. (Pois eram quase cinco mil homens.) Jesus disse aos
discípulos: Mandai-os sentar, divididos em grupos de cinqüenta.
15. Assim o fizeram e todos se assentaram.
16. Então Jesus tomou os cinco pães e os dois peixes, levantou os
olhos ao céu, abençoou-os, partiu-os e deu-os a seus discípulos, para
que os servissem ao povo.
17. E todos comeram e ficaram fartos. Do que sobrou recolheram
ainda doze cestos de pedaços.
18. Num dia em que ele estava a orar a sós com os discípulos,
perguntou-lhes: Quem dizem que eu sou?
19. Responderam-lhe: Uns dizem que és João Batista; outros,
Elias; outros pensam que ressuscitou algum dos antigos profetas.
20. Perguntou-lhes, então: E vós, quem dizeis que eu sou? Pedro
respondeu: O Cristo de Deus.
21. Ordenou-lhes energicamente que não o dissessem a ninguém.
22. Ele acrescentou: É necessário que o Filho do Homem padeça
muitas coisas, seja rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos
sacerdotes e pelos escribas. É necessário que seja levado à morte e que
ressuscite ao terceiro dia.
23. Em seguida, dirigiu-se a todos: Se alguém quer vir após mim,
renegue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me.
24. Porque, quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem
sacrificar a sua vida por amor de mim, salvá-la-á.
25. Pois que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se vem a
perder-se a si mesmo e se causa a sua própria ruína?
26. Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras, também
o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na sua glória, na
glória de seu Pai e dos santos anjos.
27. Em verdade vos digo: dos que aqui se acham, alguns há que não
morrerão, até que vejam o Reino de Deus.
28. Passados uns oitos dias, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e
João, e subiu ao monte para orar.
29. Enquanto orava, transformou-se o seu rosto e as suas vestes
tornaram-se resplandecentes de brancura.
30. E eis que falavam com ele dois personagens: eram Moisés e
Elias,
31. que apareceram envoltos em glória, e falavam da morte dele,
que se havia de cumprir em Jerusalém.
32. Entretanto, Pedro e seus companheiros tinham-se deixado
vencer pelo sono; ao despertarem, viram a glória de Jesus e os dois
personagens em sua companhia.
33. Quando estes se apartaram de Jesus, Pedro disse: Mestre, é
bom estarmos aqui. Podemos levantar três tendas: uma para ti, outra para
Moisés e outra para Elias!... Ele não sabia o que dizia.
34. Enquanto ainda assim falava, veio uma nuvem e encobriu-os com
a sua sombra; e os discípulos, vendo-os desaparecer na nuvem, tiveram um
grande pavor.
35. Então da nuvem saiu uma voz: Este é o meu Filho muito amado;
ouvi-o!
36. E, enquanto ainda ressoava esta voz, achou-se Jesus sozinho.
Os discípulos calaram-se e a ninguém disseram naqueles dias coisa alguma
do que tinham visto.
37. No dia seguinte, descendo eles do monte, veio ao encontro de
Jesus uma grande multidão.
38. Eis que um homem exclamou do meio da multidão: Mestre,
rogo-te que olhes para meu filho, pois é o único que tenho.
39. Um espírito se apodera dele e subitamente dá gritos, lança-o
por terra, agita-o com violência, fá-lo espumar e só o larga depois de o
deixar todo ofegante.
40. Pedi a teus discípulos que o expelissem, mas não o puderam
fazer.
41. Respondeu Jesus: Ó geração incrédula e perversa, até quando
estarei convosco e vos aturarei? Traze cá teu filho.
42. E quando ele ia chegando, o demônio lançou-o por terra e
agitou-o violentamente. Mas Jesus intimou o espírito imundo, curou o
menino e o restituiu a seu pai.
43. Todos ficaram pasmados ante a grandeza de Deus. Como todos se
admirassem de tudo o que Jesus fazia, disse ele a seus discípulos:
44. Gravai nos vossos corações estas palavras: O Filho do Homem
há de ser entregue às mãos dos homens!
45. Eles, porém, não entendiam esta palavra e era-lhes obscura,
de modo que não alcançaram o seu sentido; e tinham medo de lhe perguntar
a este respeito.
46. Veio-lhes então o pensamento de qual deles seria o maior.
47. Penetrando Jesus nos pensamentos de seus corações, tomou um
menino, colocou-o junto de si e disse-lhes:
48. Todo o que recebe este menino em meu nome, a mim é que recebe;
e quem recebe a mim, recebe aquele que me enviou; pois quem dentre vós
for o menor, esse será grande.
49. João tomou a palavra e disse: Mestre, vimos um homem que
expelia demônios em teu nome, e nós lho proibimos, porque não é dos
nossos.
50. Mas Jesus lhe disse: Não lho proibais; porque, o que não é
contra vós, é a vosso favor.
51. Aproximando-se o tempo em que Jesus devia ser arrebatado
deste mundo, ele resolveu dirigir-se a Jerusalém.
52. Enviou diante de si mensageiros que, tendo partido, entraram
em uma povoação dos samaritanos para lhe arranjar pousada.
53. Mas não o receberam, por ele dar mostras de que ia para
Jerusalém.
54. Vendo isto, Tiago e João disseram: Senhor, queres que
mandemos que desça fogo do céu e os consuma?
55. Jesus voltou-se e repreendeu-os severamente. [Não sabeis de
que espírito sois animados.
56. O Filho do Homem não veio para perder as vidas dos homens,
mas para salvá-las.] Foram então para outra povoação.
57. Enquanto caminhavam, um homem lhe disse: Senhor, seguir-te-ei
para onde quer que vás.
58. Jesus replicou-lhe: As raposas têm covas e as aves do céu,
ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.
59. A outro disse: Segue-me. Mas ele pediu: Senhor, permite-me ir
primeiro enterrar meu pai.
60. Mas Jesus disse-lhe: Deixa que os mortos enterrem seus mortos;
tu, porém, vai e anuncia o Reino de Deus.
61. Um outro ainda lhe falou: Senhor, seguir-te-ei, mas permite
primeiro que me despeça dos que estão em casa.
62. Mas Jesus disse-lhe: Aquele que põe a mão no arado e olha
para trás, não é apto para o Reino de Deus.
Capítulo 10
1. Depois disso, designou o Senhor ainda setenta e dois outros
discípulos e mandou-os, dois a dois, adiante de si, por todas as cidades
e lugares para onde ele tinha de ir.
2. Disse-lhes: Grande é a messe, mas poucos são os operários.
Rogai ao Senhor da messe que mande operários para a sua messe.
3. Ide; eis que vos envio como cordeiros entre lobos.
4. Não leveis bolsa nem mochila, nem calçado e a ninguém saudeis
pelo caminho.
5. Em toda casa em que entrardes, dizei primeiro: Paz a esta
casa!
6. Se ali houver algum homem pacífico, repousará sobre ele a
vossa paz; mas, se não houver, ela tornará para vós.
7. Permanecei na mesma casa, comei e bebei do que eles tiverem,
pois o operário é digno do seu salário. Não andeis de casa em casa.
8. Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei o
que se vos servir.
9. Curai os enfermos que nela houver e dizei-lhes: O Reino de
Deus está próximo.
10. Mas se entrardes nalguma cidade e não vos receberem, saindo
pelas suas praças, dizei:
11. Até o pó que se nos pegou da vossa cidade, sacudimos contra
vós; sabei, contudo, que o Reino de Deus está próximo.
12. Digo-vos: naqueles dias haverá um tratamento menos rigoroso
para Sodoma.
13. Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e
Sidônia tivessem sido feitos os prodígios que foram realizados em vosso
meio, há muito tempo teriam feito penitência, cobrindo-se de saco e
cinza.
14. Por isso haverá no dia do juízo menos rigor para Tiro e
Sidônia do que para vós.
15. E tu, Cafarnaum, que te elevas até o céu, serás precipitada
até aos infernos.
16. Quem vos ouve, a mim ouve; e quem vos rejeita, a mim rejeita;
e quem me rejeita, rejeita aquele que me enviou.
17. Voltaram alegres os setenta e dois, dizendo: Senhor, até os
demônios se nos submetem em teu nome!
18. Jesus disse-lhes: Vi Satanás cair do céu como um raio.
19. Eis que vos dei poder para pisar serpentes, escorpiões e todo
o poder do inimigo.
20. Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos estão
sujeitos, mas alegrai-vos de que os vossos nomes estejam escritos nos
céus.
21. Naquele mesma hora, Jesus exultou de alegria no Espírito
Santo e disse: Pai, Senhor do céu e da terra, eu te dou graças porque
escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelaste aos
pequeninos. Sim, Pai, bendigo-te porque assim foi do teu agrado.
22. Todas as coisas me foram entregues por meu Pai. Ninguém
conhece quem é o Filho senão o Pai, nem quem é o Pai senão o Filho, e
aquele a quem o Filho o quiser revelar.
23. E voltou-se para os seus discípulos, e disse: Ditosos os
olhos que vêem o que vós vedes,
24. pois vos digo que muitos profetas e reis desejaram ver o que
vós vedes, e não o viram; e ouvir o que vós ouvis, e não o ouviram.
25. Levantou-se um doutor da lei e, para pô-lo à prova, perguntou:
Mestre, que devo fazer para possuir a vida eterna?
26. Disse-lhe Jesus: Que está escrito na lei? Como é que lês?
27. Respondeu ele: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração,
de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu pensamento (Dt
6,5); e a teu próximo como a ti mesmo (Lv 19,18).
28. Falou-lhe Jesus: Respondeste bem; faze isto e viverás.
29. Mas ele, querendo justificar-se, perguntou a Jesus: E quem é
o meu próximo?
30. Jesus então contou: Um homem descia de Jerusalém a Jericó, e
caiu nas mãos de ladrões, que o despojaram; e depois de o terem
maltratado com muitos ferimentos, retiraram-se, deixando-o meio morto.
31. Por acaso desceu pelo mesmo caminho um sacerdote, viu-o e
passou adiante.
32. Igualmente um levita, chegando àquele lugar, viu-o e passou
também adiante.
33. Mas um samaritano que viajava, chegando àquele lugar, viu-o e
moveu-se de compaixão.
34. Aproximando-se, atou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e
vinho; colocou-o sobre a sua própria montaria e levou-o a uma hospedaria
e tratou dele.
35. No dia seguinte, tirou dois denários e deu-os ao hospedeiro,
dizendo-lhe: Trata dele e, quanto gastares a mais, na volta to pagarei.
36. Qual destes três parece ter sido o próximo daquele que caiu
nas mãos dos ladrões?
37. Respondeu o doutor: Aquele que usou de misericórdia para com
ele. Então Jesus lhe disse: Vai, e faze tu o mesmo.
38. Estando Jesus em viagem, entrou numa aldeia, onde uma mulher,
chamada Marta, o recebeu em sua casa.
39. Tinha ela uma irmã por nome Maria, que se assentou aos pés do
Senhor para ouvi-lo falar.
40. Marta, toda preocupada na lida da casa, veio a Jesus e disse:
Senhor, não te importas que minha irmã me deixe só a servir? Dize-lhe
que me ajude.
41. Respondeu-lhe o Senhor: Marta, Marta, andas muito inquieta e
te preocupas com muitas coisas;
42. no entanto, uma só coisa é necessária; Maria escolheu a boa
parte, que lhe não será tirada.
Capítulo 11
1. Um dia, num certo lugar, estava Jesus a rezar. Terminando a
oração, disse-lhe um de seus discípulos: Senhor, ensina-nos a rezar,
como também João ensinou a seus discípulos.
2. Disse-lhes ele, então: Quando orardes, dizei: Pai, santificado
seja o vosso nome; venha o vosso Reino;
3. dai-nos hoje o pão necessário ao nosso sustento;
4. perdoai-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos
àqueles que nos ofenderam; e não nos deixeis cair em tentação.
5. Em seguida, ele continuou: Se alguém de vós tiver um amigo e
for procurá-lo à meia-noite, e lhe disser: Amigo, empresta-me três pães,
6. pois um amigo meu acaba de chegar à minha casa, de uma viagem,
e não tenho nada para lhe oferecer;
7. e se ele responder lá de dentro: Não me incomodes; a porta já
está fechada, meus filhos e eu estamos deitados; não posso levantar-me
para te dar os pães;
8. eu vos digo: no caso de não se levantar para lhe dar os pães
por ser seu amigo, certamente por causa da sua importunação se levantará
e lhe dará quantos pães necessitar.
9. E eu vos digo: pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei,
e abrir-se-vos-á.
10. Pois todo aquele que pede, recebe; aquele que procura, acha;
e ao que bater, se lhe abrirá.
11. Se um filho pedir um pão, qual o pai entre vós que lhe dará
uma pedra? Se ele pedir um peixe, acaso lhe dará uma serpente?
12. Ou se lhe pedir um ovo, dar-lhe-á porventura um escorpião?
13. Se vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas coisas a vossos
filhos, quanto mais vosso Pai celestial dará o Espírito Santo aos que
lho pedirem.
14. Jesus expelia um demônio que era mudo. Tendo o demônio saído,
o mudo pôs-se a falar e a multidão ficou admirada.
15. Mas alguns deles disseram: Ele expele os demônios por
Beelzebul, príncipe dos demônios.
16. E para pô-lo à prova, outros lhe pediam um sinal do céu.
17. Penetrando nos seus pensamentos, disse-lhes Jesus: Todo o
reino dividido contra si mesmo será destruído e seus edifícios cairão
uns sobre os outros.
18. Se, pois, Satanás está dividido contra si mesmo, como
subsistirá o seu reino? Pois dizeis que expulso os demônios por
Beelzebul.
19. Ora, se é por Beelzebul que expulso os demônios, por quem o
expulsam vossos filhos? Por isso, eles mesmos serão os vossos juízes!
20. Mas se expulso os demônios pelo dedo de Deus, certamente é
chegado a vós o Reino de Deus.
21. Quando um homem forte guarda armado a sua casa, estão em
segurança os bens que possui.
22. Mas se sobrevier outro mais forte do que ele e o vencer, este
lhe tirará todas as armas em que confiava, e repartirá os seus despojos.
23. Quem não está comigo, está contra mim; quem não recolhe
comigo, espalha.
24. Quando um espírito imundo sai do homem, anda por lugares
áridos, buscando repouso; não o achando, diz: Voltarei à minha casa,
donde saí.
25. Chegando, acha-a varrida e adornada.
26. Vai então e toma consigo outros sete espíritos piores do que
ele e entram e estabelecem-se ali. E a última condição desse homem vem a
ser pior do que a primeira.
27. Enquanto ele assim falava, uma mulher levantou a voz do meio
do povo e lhe disse: Bem-aventurado o ventre que te trouxe, e os peitos
que te amamentaram!
28. Mas Jesus replicou: Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a
palavra de Deus e a observam!
29. Afluía o povo e ele continuou: Esta geração é uma geração
perversa; pede um sinal, mas não se lhe dará outro sinal senão o sinal
do profeta Jonas.
30. Pois, como Jonas foi um sinal para os ninivitas, assim o
Filho do Homem o será para esta geração.
31. A rainha do meio-dia levantar-se-á no dia do juízo para
condenar os homens desta geração, porque ela veio dos confins da terra
ouvir a sabedoria de Salomão! Ora, aqui está quem é mais que Salomão.
32. Os ninivitas levantar-se-ão no dia do juízo para condenar os
homens desta geração, porque fizeram penitência com a pregação de Jonas.
Ora, aqui está quem é mais do que Jonas.
33. Ninguém acende uma lâmpada e a põe em lugar oculto ou debaixo
da amassadeira, mas sobre um candeeiro, para alumiar os que entram.
34. O olho é a lâmpada do corpo. Se teu olho é são, todo o corpo
será bem iluminado; se, porém, estiver em mau estado, o teu corpo estará
em trevas.
35. Vê, pois, que a luz que está em ti não sejam trevas.
36. Se, pois, todo o teu corpo estiver na luz, sem mistura de
trevas, ele será inteiramente iluminado, como sob a brilhante luz de uma
lâmpada.
37. Enquanto Jesus falava, pediu-lhe um fariseu que fosse jantar
em sua companhia. Ele entrou e pôs-se à mesa.
38. Admirou-se o fariseu de que ele não se tivesse lavado antes
de comer.
39. Disse-lhe o Senhor: Vós, fariseus, limpais o que está por
fora do vaso e do prato, mas o vosso interior está cheio de roubo e
maldade!
40. Insensatos! Quem fez o exterior não fez também o conteúdo?
41. Dai antes em esmola o que possuís, e todas as coisas vos
serão limpas.
42. Ai de vós, fariseus, que pagais o dízimo da hortelã, da
arruda e de diversas ervas e desprezais a justiça e o amor de Deus. No
entanto, era necessário praticar estas coisas, sem contudo deixar de
fazer aquelas outras coisas.
43. Ai de vós, fariseus, que gostais das primeiras cadeiras nas
sinagogas e das saudações nas praças públicas!
44. Ai de vós, que sois como os sepulcros que não aparecem, e
sobre os quais os homens caminham sem o saber.
45. Um dos doutores da lei lhe disse: Mestre, falando assim
também a nós outros nos afrontas.
46. Ele respondeu: Ai também de vós, doutores da lei, que
carregais os homens com pesos que não podem levar, mas vós mesmos nem
sequer com um dedo vosso tocais os fardos.
47. Ai de vós, que edificais sepulcros para os profetas que
vossos pais mataram.
48. Vós servis assim de testemunhas das obras de vossos pais e as
aprovais, porque em verdade eles os mataram, mas vós lhes edificais os
sepulcros.
49. Por isso, também disse a sabedoria de Deus: Enviar-lhes-ei
profetas e apóstolos, mas eles darão a morte a uns e perseguirão a
outros.
50. E assim se pedirá conta a esta geração do sangue de todos os
profetas derramado desde a criação do mundo,
51. desde o sangue de Abel até o sangue de Zacarias, que foi
assassinado entre o altar e o templo. Sim, declaro-vos que se pedirá
conta disso a esta geração!
52. Ai de vós, doutores da lei, que tomastes a chave da ciência,
e vós mesmos não entrastes e impedistes aos que vinham para entrar.
53. Depois que Jesus saiu dali, os escribas e fariseus começaram
a importuná-lo fortemente e a persegui-lo com muitas perguntas,
54. armando-lhe desta maneira ciladas, e procurando surpreendê-lo
nalguma palavra de sua boca.
Capítulo 12
1. Enquanto isso, os homens se tinham reunido aos milhares em
torno de Jesus, de modo que se atropelavam uns aos outros. Jesus começou
a dizer a seus discípulos: Guardai-vos do fermento dos fariseus, que é a
hipocrisia.
2. Porque não há nada oculto que não venha a descobrir-se, e nada
há escondido que não venha a ser conhecido.
3. Pois o que dissestes às escuras será dito à luz; e o que
falastes ao ouvido, nos quartos, será publicado de cima dos telhados.
4. Digo-vos a vós, meus amigos: não tenhais medo daqueles que
matam o corpo e depois disto nada mais podem fazer.
5. Mostrar-vos-ei a quem deveis temer: temei àquele que, depois
de matar, tem poder de lançar no inferno; sim, eu vo-lo digo: temei a
este.
6. Não se vendem cinco pardais por dois asses? E, entretanto, nem
um só deles passa despercebido diante de Deus.
7. Até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não
temais, pois. Mais valor tendes vós do que numerosos pardais.
8. Digo-vos: todo o que me reconhecer diante dos homens, também o
Filho do Homem o reconhecerá diante dos anjos de Deus;
9. mas quem me negar diante dos homens será negado diante dos
anjos de Deus.
10. Todo aquele que tiver falado contra o Filho do Homem obterá
perdão, mas aquele que tiver blasfemado contra o Espírito Santo não
alcançará perdão.
11. Quando, porém, vos levarem às sinagogas, perante os
magistrados e as autoridades, não vos preocupeis com o que haveis de
falar em vossa defesa,
12. porque o Espírito Santo vos inspirará naquela hora o que
deveis dizer.
13. Disse-lhe então alguém do meio do povo: Mestre, dize a meu
irmão que reparta comigo a herança.
14. Jesus respondeu-lhe: Meu amigo, quem me constituiu juiz ou
árbitro entre vós?
15. E disse então ao povo: Guardai-vos escrupulosamente de toda a
avareza, porque a vida de um homem, ainda que ele esteja na abundância,
não depende de suas riquezas.
16. E propôs-lhe esta parábola: Havia um homem rico cujos campos
produziam muito.
17. E ele refletia consigo: Que farei? Porque não tenho onde
recolher a minha colheita.
18. Disse então ele: Farei o seguinte: derrubarei os meus
celeiros e construirei maiores; neles recolherei toda a minha colheita e
os meus bens.
19. E direi à minha alma: ó minha alma, tens muitos bens em
depósito para muitíssimos anos; descansa, come, bebe e regala-te.
20. Deus, porém, lhe disse: Insensato! Nesta noite ainda exigirão
de ti a tua alma. E as coisas, que ajuntaste, de quem serão?
21. Assim acontece ao homem que entesoura para si mesmo e não é
rico para Deus.
22. Jesus voltou-se então para seus discípulos: Portanto vos digo:
não andeis preocupados com a vossa vida, pelo que haveis de comer; nem
com o vosso corpo, pelo que haveis de vestir.
23. A vida vale mais do que o sustento e o corpo mais do que as
vestes.
24. Considerai os corvos: eles não semeiam, nem ceifam, nem têm
despensa, nem celeiro; entretanto, Deus os sustenta. Quanto mais valeis
vós do que eles?
25. Mas qual de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar
um só côvado à duração de sua vida?
26. Se vós, pois, não podeis fazer nem as mínimas coisas, por que
estais preocupados com as outras?
27. Considerai os lírios, como crescem; não fiam, nem tecem.
Contudo, digo-vos: nem Salomão em toda a sua glória jamais se vestiu
como um deles.
28. Se Deus, portanto, veste assim a erva que hoje está no campo
e amanhã se lança ao fogo, quanto mais a vós, homens de fé pequenina!
29. Não vos inquieteis com o que haveis de comer ou beber; e não
andeis com vãs preocupações.
30. Porque os homens do mundo é que se preocupam com todas estas
coisas. Mas vosso Pai bem sabe que precisais de tudo isso.
31. Buscai antes o Reino de Deus e a sua justiça e todas estas
coisas vos serão dadas por acréscimo.
32. Não temais, pequeno rebanho, porque foi do agrado de vosso
Pai dar-vos o Reino.
33. Vendei o que possuís e dai esmolas; fazei para vós bolsas que
não se gastam, um tesouro inesgotável nos céus, aonde não chega o ladrão
e a traça não o destrói.
34. Pois onde estiver o vosso tesouro, ali estará também o vosso
coração.
35. Estejam cingidos os vossos rins e acesas as vossas lâmpadas.
36. Sede semelhantes a homens que esperam o seu senhor, ao voltar
de uma festa, para que, quando vier e bater à porta, logo lha abram.
37. Bem-aventurados os servos a quem o senhor achar vigiando,
quando vier! Em verdade vos digo: cingir-se-á, fá-los-á sentar à mesa e
servi-los-á.
38. Se vier na segunda ou se vier na terceira vigília e os achar
vigilantes, felizes daqueles servos!
39. Sabei, porém, isto: se o senhor soubesse a que hora viria o
ladrão, vigiaria sem dúvida e não deixaria forçar a sua casa.
40. Estai, pois, preparados, porque, à hora em que não pensais,
virá o Filho do Homem.
41. Disse-lhe Pedro: Senhor, propões esta parábola só a nós ou
também a todos?
42. O Senhor replicou: Qual é o administrador sábio e fiel que o
senhor estabelecerá sobre os seus operários para lhes dar a seu tempo a
sua medida de trigo?
43. Feliz daquele servo que o senhor achar procedendo assim,
quando vier!
44. Em verdade vos digo: confiar-lhe-á todos os seus bens.
45. Mas, se o tal administrador imaginar consigo: Meu senhor
tardará a vir, e começar a espancar os servos e as servas, a comer, a
beber e a embriagar-se,
46. o senhor daquele servo virá no dia em que não o esperar e na
hora em que ele não pensar, e o despedirá e o mandará ao destino dos
infiéis.
47. O servo que, apesar de conhecer a vontade de seu senhor, nada
preparou e lhe desobedeceu será açoitado com numerosos golpes.
48. Mas aquele que, ignorando a vontade de seu senhor, fizer
coisas repreensíveis será açoitado com poucos golpes. Porque, a quem
muito se deu, muito se exigirá. Quanto mais se confiar a alguém, dele
mais se há de exigir.
49. Eu vim lançar fogo à terra, e que tenho eu a desejar se ele
já está aceso?
50. Mas devo ser batizado num batismo; e quanto anseio até que
ele se cumpra!
51. Julgais que vim trazer paz à terra? Não, digo-vos, mas
separação.
52. Pois de ora em diante haverá numa mesma casa cinco pessoas
divididas, três contra duas, e duas contra três;
53. estarão divididos: o pai contra o filho, e o filho contra o
pai; a mãe contra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra a
nora, e a nora contra a sogra.
54. Dizia ainda ao povo: Quando vedes levantar-se uma nuvem no
poente, logo dizeis: Aí vem chuva. E assim sucede.
55. Quando vedes soprar o vento do sul, dizeis: Haverá calor. E
assim acontece.
56. Hipócritas! Sabeis distinguir os aspectos do céu e da terra;
como, pois, não sabeis reconhecer o tempo presente?
57. Por que também não julgais por vós mesmos o que é justo?
58. Ora, quando fores com o teu adversário ao magistrado, faze o
possível para entrar em acordo com ele pelo caminho, a fim de que ele te
não arraste ao juiz, e o juiz te entregue ao executor, e o executor te
ponha na prisão.
59. Digo-te: não sairás dali, até pagares o último centavo.
Capítulo 13
1. Neste mesmo tempo contavam alguns o que tinha acontecido a
certos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com os seus sacrifícios.
2. Jesus toma a palavra e lhes pergunta: Pensais vós que estes
galileus foram maiores pecadores do que todos os outros galileus, por
terem sido tratados desse modo?
3. Não, digo-vos. Mas se não vos arrependerdes, perecereis todos
do mesmo modo.
4. Ou cuidais que aqueles dezoito homens, sobre os quais caiu a
torre de Siloé e os matou, foram mais culpados do que todos os demais
habitantes de Jerusalém?
5. Não, digo-vos. Mas se não vos arrependerdes, perecereis todos
do mesmo modo.
6. Disse-lhes também esta comparação: Um homem havia plantado uma
figueira na sua vinha, e, indo buscar fruto, não o achou.
7. Disse ao viticultor: - Eis que três anos há que venho
procurando fruto nesta figueira e não o acho. Corta-a; para que ainda
ocupa inutilmente o terreno?
8. Mas o viticultor respondeu: - Senhor, deixa-a ainda este ano;
eu lhe cavarei em redor e lhe deitarei adubo.
9. Talvez depois disto dê frutos. Caso contrário, cortá-la-ás.
10. Estava Jesus ensinando na sinagoga em um sábado.
11. Havia ali uma mulher que, havia dezoito anos, era possessa de
um espírito que a detinha doente: andava curvada e não podia
absolutamente erguer-se.
12. Ao vê-la, Jesus a chamou e disse-lhe: Estás livre da tua
doença.
13. Impôs-lhe as mãos e no mesmo instante ela se endireitou,
glorificando a Deus.
14. Mas o chefe da sinagoga, indignado de ver que Jesus curava no
sábado, disse ao povo: São seis os dias em que se deve trabalhar; vinde,
pois, nestes dias para vos curar, mas não em dia de sábado.
15. Hipócritas!, disse-lhes o Senhor. Não desamarra cada um de
vós no sábado o seu boi ou o seu jumento da manjedoura, para os levar a
beber?
16. Esta filha de Abraão, que Satanás paralisava há dezoito anos,
não devia ser livre desta prisão, em dia de sábado?
17. Ao proferir estas palavras, todos os seus adversários se
encheram de confusão, ao passo que todo o povo, à vista de todos os
milagres que ele realizava, se entusiasmava.
18. Jesus dizia ainda: A que é semelhante o Reino de Deus, e a
que o compararei?
19. É semelhante ao grão de mostarda que um homem tomou e semeou
na sua horta, e que cresceu até se fazer uma grande planta e as aves do
céu vieram fazer ninhos nos seus ramos.
20. Disse ainda: A que direi que é semelhante o Reino de Deus?
21. É semelhante ao fermento que uma mulher tomou e misturou em
três medidas de farinha e toda a massa ficou levedada.
22. Sempre em caminho para Jerusalém, Jesus ia atravessando
cidades e aldeias e nelas ensinava.
23. Alguém lhe perguntou: Senhor, são poucos os homens que se
salvam? Ele respondeu:
24. Procurai entrar pela porta estreita; porque, digo-vos, muitos
procurarão entrar e não o conseguirão.
25. Quando o pai de família tiver entrado e fechado a porta, e
vós, de fora, começardes a bater à porta, dizendo: Senhor, Senhor,
abre-nos, ele responderá: Digo-vos que não sei de onde sois.
26. Direis então: Comemos e bebemos contigo e tu ensinaste em
nossas praças.
27. Ele, porém, vos dirá: Não sei de onde sois; apartai-vos de
mim todos vós que sois malfeitores.
28. Ali haverá choro e ranger de dentes, quando virdes Abraão,
Isaac, Jacó e todos os profetas no Reino de Deus, e vós serdes lançados
para fora.
29. Virão do oriente e do ocidente, do norte e do sul, e
sentar-se-ão à mesa no Reino de Deus.
30. Há últimos que serão os primeiros, e há primeiros que serão
os últimos.
31. No mesmo dia chegaram alguns dos fariseus, dizendo a Jesus:
Sai e vai-te daqui, porque Herodes te quer matar.
32. Disse-lhes ele: Ide dizer a essa raposa: eis que expulso
demônios e faço curas hoje e amanhã; e ao terceiro dia terminarei a
minha vida.
33. É necessário, todavia, que eu caminhe hoje, amanhã e depois
de amanhã, porque não é admissível que um profeta morra fora de
Jerusalém.
34. Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os
enviados de Deus, quantas vezes quis ajuntar os teus filhos, como a
galinha abriga a sua ninhada debaixo das asas, mas não o quiseste!
35. Eis que vos ficará deserta a vossa casa. Digo-vos, porém, que
não me vereis até que venha o dia em que digais: Bendito o que vem em
nome do Senhor!
Capítulo 14
1. Jesus entrou num sábado em casa de um fariseu notável, para
uma refeição; eles o observavam.
2. Havia ali um homem hidrópico.
3. Jesus dirigiu-se aos doutores da lei e aos fariseus: É
permitido ou não fazer curas no dia de sábado?
4. Eles nada disseram. Então Jesus, tomando o homem pela mão,
curou-o e despediu-o.
5. Depois, dirigindo-se a eles, disse: Qual de vós que, se lhe
cair o jumento ou o boi num poço, não o tira imediatamente, mesmo em dia
de sábado?
6. A isto nada lhe podiam replicar.
7. Observando também como os convivas escolhiam os primeiros
lugares, propôs-lhes a seguinte parábola:
8. Quando fores convidado às bodas, não te sentes no primeiro
lugar, pois pode ser que seja convidada outra pessoa de mais
consideração do que tu,
9. e vindo o que te convidou, te diga: Cede o lugar a este.
Terias então a confusão de dever ocupar o último lugar.
10. Mas, quando fores convidado, vai tomar o último lugar, para
que, quando vier o que te convidou, te diga: Amigo, passa mais para
cima. Então serás honrado na presença de todos os convivas.
11. Porque todo aquele que se exaltar será humilhado, e todo
aquele que se humilhar será exaltado.
12. Dizia igualmente ao que o tinha convidado: Quando deres
alguma ceia, não convides os teus amigos, nem teus irmãos, nem os
parentes, nem os vizinhos ricos. Porque, por sua vez, eles te convidarão
e assim te retribuirão.
13. Mas, quando deres uma ceia, convida os pobres, os aleijados,
os coxos e os cegos.
14. Serás feliz porque eles não têm com que te retribuir, mas
ser-te-á retribuído na ressurreição dos justos.
15. A estas palavras, disse a Jesus um dos convidados: Feliz
daquele que se sentar à mesa no Reino de Deus!
16. Respondeu-lhe Jesus: Um homem deu uma grande ceia e convidou
muitas pessoas.
17. E à hora da ceia, enviou seu servo para dizer aos convidados:
Vinde, tudo já está preparado.
18. Mas todos, um a um, começaram a escusar-se. Disse-lhe o
primeiro: Comprei um terreno e preciso sair para vê-lo; rogo-te me dês
por escusado.
19. Disse outro: Comprei cinco juntas de bois e vou
experimentá-las; rogo-te me dês por escusado.
20. Disse também um outro: Casei-me e por isso não posso ir.
21. Voltou o servo e referiu isto a seu senhor. Então, irado, o
pai de família disse a seu servo: Sai, sem demora, pelas praças e pelas
ruas da cidade e introduz aqui os pobres, os aleijados, os cegos e os
coxos.
22. Disse o servo: Senhor, está feito como ordenaste e ainda há
lugar.
23. O senhor ordenou: Sai pelos caminhos e atalhos e obriga todos
a entrar, para que se encha a minha casa.
24. Pois vos digo: nenhum daqueles homens, que foram convidados,
provará a minha ceia.
25. Muito povo acompanhava Jesus. Voltando-se, disse-lhes:
26. Se alguém vem a mim e não odeia seu pai, sua mãe, sua mulher,
seus filhos, seus irmãos, suas irmãs e até a sua própria vida, não pode
ser meu discípulo.
27. E quem não carrega a sua cruz e me segue, não pode ser meu
discípulo.
28. Quem de vós, querendo fazer uma construção, antes não se
senta para calcular os gastos que são necessários, a fim de ver se tem
com que acabá-la?
29. Para que, depois que tiver lançado os alicerces e não puder
acabá-la, todos os que o virem não comecem a zombar dele,
30. dizendo: Este homem principiou a edificar, mas não pode
terminar.
31. Ou qual é o rei que, estando para guerrear com outro rei, não
se senta primeiro para considerar se com dez mil homens poderá enfrentar
o que vem contra ele com vinte mil?
32. De outra maneira, quando o outro ainda está longe, envia-lhe
embaixadores para tratar da paz.
33. Assim, pois, qualquer um de vós que não renuncia a tudo o que
possui não pode ser meu discípulo.
34. O sal é uma coisa boa, mas se ele perder o seu sabor, com que
o recuperará?
35. Não servirá nem para a terra nem para adubo, mas lançar-se-á
fora. O que tem ouvidos para ouvir, ouça!
Capítulo 15
1. Aproximavam-se de Jesus os publicanos e os pecadores para
ouvi-lo.
2. Os fariseus e os escribas murmuravam: Este homem recebe e come
com pessoas de má vida!
3. Então lhes propôs a seguinte parábola:
4. Quem de vós que, tendo cem ovelhas e perdendo uma delas, não
deixa as noventa e nove no deserto e vai em busca da que se perdeu, até
encontrá-la?
5. E depois de encontrá-la, a põe nos ombros, cheio de júbilo,
6. e, voltando para casa, reúne os amigos e vizinhos,
dizendo-lhes: Regozijai-vos comigo, achei a minha ovelha que se havia
perdido.
7. Digo-vos que assim haverá maior júbilo no céu por um só
pecador que fizer penitência do que por noventa e nove justos que não
necessitam de arrependimento.
8. Ou qual é a mulher que, tendo dez dracmas e perdendo uma
delas, não acende a lâmpada, varre a casa e a busca diligentemente, até
encontrá-la?
9. E tendo-a encontrado, reúne as amigas e vizinhas, dizendo:
Regozijai-vos comigo, achei a dracma que tinha perdido.
10. Digo-vos que haverá júbilo entre os anjos de Deus por um só
pecador que se arrependa.
11. Disse também: Um homem tinha dois filhos.
12. O mais moço disse a seu pai: Meu pai, dá-me a parte da
herança que me toca. O pai então repartiu entre eles os haveres.
13. Poucos dias depois, ajuntando tudo o que lhe pertencia,
partiu o filho mais moço para um país muito distante, e lá dissipou a
sua fortuna, vivendo dissolutamente.
14. Depois de ter esbanjado tudo, sobreveio àquela região uma
grande fome e ele começou a passar penúria.
15. Foi pôr-se ao serviço de um dos habitantes daquela região,
que o mandou para os seus campos guardar os porcos.
16. Desejava ele fartar-se das vagens que os porcos comiam, mas
ninguém lhas dava.
17. Entrou então em si e refletiu: Quantos empregados há na casa
de meu pai que têm pão em abundância... e eu, aqui, estou a morrer de
fome!
18. Levantar-me-ei e irei a meu pai, e dir-lhe-ei: Meu pai,
pequei contra o céu e contra ti;
19. já não sou digno de ser chamado teu filho. Trata-me como a um
dos teus empregados.
20. Levantou-se, pois, e foi ter com seu pai. Estava ainda longe,
quando seu pai o viu e, movido de compaixão, correu-lhe ao encontro,
lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou.
21. O filho lhe disse, então: Meu pai, pequei contra o céu e
contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho.
22. Mas o pai falou aos servos: Trazei-me depressa a melhor veste
e vesti-lha, e ponde-lhe um anel no dedo e calçado nos pés.
23. Trazei também um novilho gordo e matai-o; comamos e façamos
uma festa.
24. Este meu filho estava morto, e reviveu; tinha se perdido, e
foi achado. E começaram a festa.
25. O filho mais velho estava no campo. Ao voltar e aproximar-se
da casa, ouviu a música e as danças.
26. Chamou um servo e perguntou-lhe o que havia.
27. Ele lhe explicou: Voltou teu irmão. E teu pai mandou matar um
novilho gordo, porque o reencontrou são e salvo.
28. Encolerizou-se ele e não queria entrar, mas seu pai saiu e
insistiu com ele.
29. Ele, então, respondeu ao pai: Há tantos anos que te sirvo,
sem jamais transgredir ordem alguma tua, e nunca me deste um cabrito
para festejar com os meus amigos.
30. E agora, que voltou este teu filho, que gastou os teus bens
com as meretrizes, logo lhe mandaste matar um novilho gordo!
31. Explicou-lhe o pai: Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o
que é meu é teu.
32. Convinha, porém, fazermos festa, pois este teu irmão estava
morto, e reviveu; tinha se perdido, e foi achado.
Capítulo 16
1. Jesus disse também a seus discípulos: Havia um homem rico que
tinha um administrador. Este lhe foi denunciado de ter dissipado os seus
bens.
2. Ele chamou o administrador e lhe disse: Que é que ouço dizer
de ti? Presta contas da tua administração, pois já não poderás
administrar meus bens.
3. O administrador refletiu então consigo: Que farei, visto que
meu patrão me tira o emprego? Lavrar a terra? Não o posso. Mendigar?
Tenho vergonha.
4. Já sei o que fazer, para que haja quem me receba em sua casa,
quando eu for despedido do emprego.
5. Chamou, pois, separadamente a cada um dos devedores de seu
patrão e perguntou ao primeiro: Quanto deves a meu patrão?
6. Ele respondeu: Cem medidas de azeite. Disse-lhe: Toma a tua
conta, senta-te depressa e escreve: cinqüenta.
7. Depois perguntou ao outro: Tu, quanto deves? Respondeu: Cem
medidas de trigo. Disse-lhe o administrador: Toma os teus papéis e
escreve: oitenta.
8. E o proprietário admirou a astúcia do administrador, porque os
filhos deste mundo são mais prudentes do que os filhos da luz no trato
com seus semelhantes.
9. Eu vos digo: fazei-vos amigos com a riqueza injusta, para que,
no dia em que ela vos faltar, eles vos recebam nos tabernáculos eternos.
10. Aquele que é fiel nas coisas pequenas será também fiel nas
coisas grandes. E quem é injusto nas coisas pequenas, sê-lo-á também nas
grandes.
11. Se, pois, não tiverdes sido fiéis nas riquezas injustas, quem
vos confiará as verdadeiras?
12. E se não fostes fiéis no alheio, quem vos dará o que é vosso?
13. Nenhum servo pode servir a dois senhores: ou há de odiar a um
e amar o outro, ou há de aderir a um e desprezar o outro. Não podeis
servir a Deus e ao dinheiro.
14. Ora, ouviam tudo isto os fariseus, que eram avarentos, e
zombavam dele.
15. Jesus disse-lhes: Vós procurais parecer justos aos olhos dos
homens, mas Deus vos conhece os corações; pois o que é elevado aos olhos
dos homens é abominável aos olhos de Deus.
16. A lei e os profetas duraram até João. Desde então é anunciado
o Reino de Deus, e cada um faz violência para aí entrar.
17. Mais facilmente, porém, passará o céu e a terra do que se
perderá uma só letra da lei.
18. Todo o que abandonar sua mulher e casar com outra, comete
adultério; e quem se casar com a mulher rejeitada, comete adultério
também.
19. Havia um homem rico que se vestia de púrpura e linho
finíssimo, e que todos os dias se banqueteava e se regalava.
20. Havia também um mendigo, por nome Lázaro, todo coberto de
chagas, que estava deitado à porta do rico.
21. Ele avidamente desejava matar a fome com as migalhas que
caíam da mesa do rico... Até os cães iam lamber-lhe as chagas.
22. Ora, aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos ao
seio de Abraão. Morreu também o rico e foi sepultado.
23. E estando ele nos tormentos do inferno, levantou os olhos e
viu, ao longe, Abraão e Lázaro no seu seio.
24. Gritou, então: - Pai Abraão, compadece-te de mim e manda
Lázaro que molhe em água a ponta de seu dedo, a fim de me refrescar a
língua, pois sou cruelmente atormentado nestas chamas.
25. Abraão, porém, replicou: - Filho, lembra-te de que recebeste
teus bens em vida, mas Lázaro, males; por isso ele agora aqui é
consolado, mas tu estás em tormento.
26. Além de tudo, há entre nós e vós um grande abismo, de maneira
que, os que querem passar daqui para vós, não o podem, nem os de lá
passar para cá.
27. O rico disse: - Rogo-te então, pai, que mandes Lázaro à casa
de meu pai, pois tenho cinco irmãos,
28. para lhes testemunhar, que não aconteça virem também eles
parar neste lugar de tormentos.
29. Abraão respondeu: - Eles lá têm Moisés e os profetas;
ouçam-nos!
30. O rico replicou: - Não, pai Abraão; mas se for a eles algum
dos mortos, arrepender-se-ão.
31. Abraão respondeu-lhe: - Se não ouvirem a Moisés e aos
profetas, tampouco se deixarão convencer, ainda que ressuscite algum dos
mortos.
Capítulo 17
1. Jesus disse também a seus discípulos: É impossível que não
haja escândalos, mas ai daquele por quem eles vêm!
2. Melhor lhe seria que se lhe atasse em volta do pescoço uma
pedra de moinho e que fosse lançado ao mar, do que levar para o mal a um
só destes pequeninos. Tomai cuidado de vós mesmos.
3. Se teu irmão pecar, repreende-o; se se arrepender, perdoa-lhe.
4. Se pecar sete vezes no dia contra ti e sete vezes no dia vier
procurar-te, dizendo: Estou arrependido, perdoar-lhe-ás.
5. Os apóstolos disseram ao Senhor: Aumenta-nos a fé!
6. Disse o Senhor: Se tiverdes fé como um grão de mostarda,
direis a esta amoreira: Arranca-te e transplanta-te no mar, e ela vos
obedecerá.
7. Qual de vós, tendo um servo ocupado em lavrar ou em guardar o
gado, quando voltar do campo lhe dirá: Vem depressa sentar-te à mesa?
8. E não lhe dirá ao contrário: Prepara-me a ceia, cinge-te e
serve-me, enquanto como e bebo, e depois disto comerás e beberás tu?
9. E se o servo tiver feito tudo o que lhe ordenara, porventura
fica-lhe o senhor devendo alguma obrigação?
10. Assim também vós, depois de terdes feito tudo o que vos foi
ordenado, dizei: Somos servos como quaisquer outros; fizemos o que
devíamos fazer.
11. Sempre em caminho para Jerusalém, Jesus passava pelos confins
da Samaria e da Galiléia.
12. Ao entrar numa aldeia, vieram-lhe ao encontro dez leprosos,
que pararam ao longe e elevaram a voz, clamando:
13. Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!
14. Jesus viu-os e disse-lhes: Ide, mostrai-vos ao sacerdote. E
quando eles iam andando, ficaram curados.
15. Um deles, vendo-se curado, voltou, glorificando a Deus em
alta voz.
16. Prostrou-se aos pés de Jesus e lhe agradecia. E era um
samaritano.
17. Jesus lhe disse: Não ficaram curados todos os dez? Onde estão
os outros nove?
18. Não se achou senão este estrangeiro que voltasse para
agradecer a Deus?!
19. E acrescentou: Levanta-te e vai, tua fé te salvou.
20. Os fariseus perguntaram um dia a Jesus quando viria o Reino
de Deus. Respondeu-lhes: O Reino de Deus não virá de um modo ostensivo.
21. Nem se dirá: Ei-lo aqui; ou: Ei-lo ali. Pois o Reino de Deus
já está no meio de vós.
22. Mais tarde ele explicou aos discípulos: Virão dias em que
desejareis ver um só dia o Filho do Homem, e não o vereis.
23. Então vos dirão: Ei-lo aqui; e: Ei-lo ali. Não deveis sair
nem os seguir.
24. Pois como o relâmpago, reluzindo numa extremidade do céu,
brilha até a outra, assim será com o Filho do Homem no seu dia.
25. É necessário, porém, que primeiro ele sofra muito e seja
rejeitado por esta geração.
26. Como ocorreu nos dias de Noé, acontecerá do mesmo modo nos
dias do Filho do Homem.
27. Comiam e bebiam, casavam-se e davam-se em casamento, até o
dia em que Noé entrou na arca. Veio o dilúvio e matou a todos.
28. Também do mesmo modo como aconteceu nos dias de Lot. Os
homens festejavam, compravam e vendiam, plantavam e edificavam.
29. No dia em que Lot saiu de Sodoma, choveu fogo e enxofre do
céu, que exterminou todos eles.
30. Assim será no dia em que se manifestar o Filho do Homem.
31. Naquele dia, quem estiver no terraço e tiver os seus bens em
casa não desça para os tirar; da mesma forma, quem estiver no campo não
torne atrás.
32. Lembrai-vos da mulher de Lot.
33. Todo o que procurar salvar a sua vida, perdê-la-á; mas todo o
que a perder, encontrá-la-á.
34. Digo-vos que naquela noite dois estarão numa cama: um será
tomado e o outro será deixado;
35. duas mulheres estarão moendo juntas: uma será tomada e a
outra será deixada.
36. Dois homens estarão no campo: um será tomado e o outro será
deixado.
37. Perguntaram-lhe os discípulos: Onde será isto, Senhor?
Respondeu-lhes: Onde estiver o cadáver, ali se reunirão também as
águias.
Capítulo 18
1. Propôs-lhes Jesus uma parábola para mostrar que é necessário
orar sempre sem jamais deixar de fazê-lo.
2. Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus, nem
respeitava pessoa alguma.
3. Na mesma cidade vivia também uma viúva que vinha com
freqüência à sua presença para dizer-lhe: Faze-me justiça contra o meu
adversário.
4. Ele, porém, por muito tempo não o quis. Por fim, refletiu
consigo: Eu não temo a Deus nem respeito os homens;
5. todavia, porque esta viúva me importuna, far-lhe-ei justiça,
senão ela não cessará de me molestar.
6. Prosseguiu o Senhor: Ouvis o que diz este juiz injusto?
7. Por acaso não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que estão
clamando por ele dia e noite? Porventura tardará em socorrê-los?
8. Digo-vos que em breve lhes fará justiça. Mas, quando vier o
Filho do Homem, acaso achará fé sobre a terra?
9. Jesus lhes disse ainda esta parábola a respeito de alguns que
se vangloriavam como se fossem justos, e desprezavam os outros:
10. Subiram dois homens ao templo para orar. Um era fariseu; o
outro, publicano.
11. O fariseu, em pé, orava no seu interior desta forma: Graças
te dou, ó Deus, que não sou como os demais homens: ladrões, injustos e
adúlteros; nem como o publicano que está ali.
12. Jejuo duas vezes na semana e pago o dízimo de todos os meus
lucros.
13. O publicano, porém, mantendo-se à distância, não ousava
sequer levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus,
tem piedade de mim, que sou pecador!
14. Digo-vos: este voltou para casa justificado, e não o outro.
Pois todo o que se exaltar será humilhado, e quem se humilhar será
exaltado.
15. Trouxeram-lhe também criancinhas, para que ele as tocasse.
Vendo isto, os discípulos as repreendiam.
16. Jesus, porém, chamou-as e disse: Deixai vir a mim as
criancinhas e não as impeçais, porque o Reino de Deus é daqueles que se
parecem com elas.
17. Em verdade vos declaro: quem não receber o Reino de Deus como
uma criancinha, nele não entrará.
18. Um homem de posição perguntou então a Jesus: Bom Mestre, que
devo fazer para possuir a vida eterna?
19. Jesus respondeu-lhe: Por que me chamas bom? Ninguém é bom
senão só Deus.
20. Conheces os mandamentos: não cometerás adultério; não
matarás; não furtarás; não dirás falso testemunho; honrarás pai e mãe.
21. Disse ele: Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade.
22. A estas palavras, Jesus lhe falou: Ainda te falta uma coisa:
vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu;
depois, vem e segue-me.
23. Ouvindo isto, ele se entristeceu, pois era muito rico.
24. Vendo-o entristecer-se, disse Jesus: Como é difícil aos ricos
entrar no Reino de Deus!
25. É mais fácil passar o camelo pelo fundo duma agulha do que um
rico entrar no Reino de Deus.
26. Perguntaram os ouvintes: Quem então poderá salvar-se?
27. Respondeu Jesus: O que é impossível aos homens é possível a
Deus.
28. Pedro então disse: Vê, nós abandonamos tudo e te seguimos.
29. Jesus respondeu: Em verdade vos declaro: ninguém há que tenha
abandonado, por amor do Reino de Deus, sua casa, sua mulher, seus
irmãos, seus pais ou seus filhos,
30. que não receba muito mais neste mundo e no mundo vindouro a
vida eterna.
31. Em seguida, Jesus tomou à parte os Doze e disse-lhes: Eis que
subimos a Jerusalém. Tudo o que foi escrito pelos profetas a respeito do
Filho do Homem será cumprido.
32. Ele será entregue aos pagãos. Hão de escarnecer dele,
ultrajá-lo, desprezá-lo;
33. bater-lhe-ão com varas e o farão morrer; e ao terceiro dia
ressurgirá.
34. Mas eles nada disto compreendiam, e estas palavras eram-lhes
um enigma cujo sentido não podiam entender.
35. Ao aproximar-se Jesus de Jericó, estava um cego sentado à
beira do caminho, pedindo esmolas.
36. Ouvindo o ruído da multidão que passava, perguntou o que
havia.
37. Responderam-lhe: É Jesus de Nazaré, que passa.
38. Ele então exclamou: Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!
39. Os que vinham na frente repreendiam-no rudemente para que se
calasse. Mas ele gritava ainda mais forte: Filho de Davi, tem piedade de
mim!
40. Jesus parou e mandou que lho trouxessem. Chegando ele perto,
perguntou-lhe:
41. Que queres que te faça? Respondeu ele: Senhor, que eu veja.
42. Jesus lhe disse: Vê! Tua fé te salvou.
43. E imediatamente ficou vendo e seguia a Jesus, glorificando a
Deus. Presenciando isto, todo o povo deu glória a Deus.
Capítulo 19
1. Jesus entrou em Jericó e ia atravessando a cidade.
2. Havia aí um homem muito rico chamado Zaqueu, chefe dos
recebedores de impostos.
3. Ele procurava ver quem era Jesus, mas não o conseguia por
causa da multidão, porque era de baixa estatura.
4. Ele correu adiande, subiu a um sicômoro para o ver, quando ele
passasse por ali.
5. Chegando Jesus àquele lugar e levantando os olhos, viu-o e
disse-lhe: Zaqueu, desce depressa, porque é preciso que eu fique hoje em
tua casa.
6. Ele desceu a toda a pressa e recebeu-o alegremente.
7. Vendo isto, todos murmuravam e diziam: Ele vai hospedar-se em
casa de um pecador...
8. Zaqueu, entretanto, de pé diante do Senhor, disse-lhe: Senhor,
vou dar a metade dos meus bens aos pobres e, se tiver defraudado alguém,
restituirei o quádruplo.
9. Disse-lhe Jesus: Hoje entrou a salvação nesta casa, porquanto
também este é filho de Abraão.
10. Pois o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava
perdido.
11. Ouviam-no falar. E como estava perto de Jerusalém, alguns se
persuadiam de que o Reino de Deus se havia de manifestar brevemente; ele
acrescentou esta parábola:
12. Um homem ilustre foi para um país distante, a fim de ser
investido da realeza e depois regressar.
13. Chamou dez dos seus servos e deu-lhes dez minas,
dizendo-lhes: Negociai até eu voltar.
14. Mas os homens daquela região odiavam-no e enviaram atrás dele
embaixadores, para protestarem: Não queremos que ele reine sobre nós.
15. Quando, investido da dignidade real, voltou, mandou chamar os
servos a quem confiara o dinheiro, a fim de saber quanto cada um tinha
lucrado.
16. Veio o primeiro: Senhor, a tua mina rendeu dez outras minas.
17. Ele lhe disse: Muito bem, servo bom; porque foste fiel nas
coisas pequenas, receberás o governo de dez cidades.
18. Veio o segundo: Senhor, a tua mina rendeu cinco outras minas.
19. Disse a este: Sê também tu governador de cinco cidades.
20. Veio também o outro: Senhor, aqui tens a tua mina, que
guardei embrulhada num lenço;
21. pois tive medo de ti, por seres homem rigoroso, que tiras o
que não puseste e ceifas o que não semeaste.
22. Replicou-lhe ele: Servo mau, pelas tuas palavras te julgo.
Sabias que sou rigoroso, que tiro o que não depositei e ceifo o que não
semeei...
23. Por que, pois, não puseste o meu dinheiro num banco? Na minha
volta, eu o teria retirado com juros.
24. E disse aos que estavam presentes: Tirai-lhe a mina, e dai-a
ao que tem dez minas.
25. Replicaram-lhe: Senhor, este já tem dez minas!...
26. Eu vos declaro: a todo aquele que tiver, dar-se-lhe-á; mas,
ao que não tiver, ser-lhe-á tirado até o que tem.
27. Quanto aos que me odeiam, e que não me quiseram por rei,
trazei-os e massacrai-os na minha presença.
28. Depois destas palavras, Jesus os foi precedendo no caminho
que sobe a Jerusalém.
29. Chegando perto de Betfagé e de Betânia, junto do monte
chamado das Oliveiras, Jesus enviou dois dos seus discípulos e
disse-lhes:
30. Ide a essa aldeia que está defronte de vós. Entrando nela,
achareis um jumentinho atado, em que nunca montou pessoa alguma;
desprendei-o e trazei-mo.
31. Se alguém vos perguntar por que o soltais, responder-lhe-eis
assim: O Senhor precisa dele.
32. Partiram os dois discípulos e acharam tudo como Jesus tinha
dito.
33. Quando desprendiam o jumentinho, perguntaram-lhes seus donos:
Por que fazeis isto?
34. Eles responderam: O Senhor precisa dele.
35. E trouxeram a Jesus o jumentinho, sobre o qual deitaram seus
mantos e fizeram Jesus montar.
36. À sua passagem, muitas pessoas estendiam seus mantos no
caminho.
37. Quando já se ia aproximando da descida do monte das
Oliveiras, toda a multidão dos discípulos, tomada de alegria, começou a
louvar a Deus em altas vozes, por todas as maravilhas que tinha visto.
38. E dizia: Bendito o rei que vem em nome do Senhor! Paz no céu
e glória no mais alto dos céus!
39. Neste momento, alguns fariseus interpelaram a Jesus no meio
da multidão: Mestre, repreende os teus discípulos.
40. Ele respondeu: Digo-vos: se estes se calarem, clamarão as
pedras!
41. Aproximando-se ainda mais, Jesus contemplou Jerusalém e
chorou sobre ela, dizendo:
42. Oh! Se também tu, ao menos neste dia que te é dado,
conhecesses o que te pode trazer a paz!... Mas não, isso está oculto aos
teus olhos.
43. Virão sobre ti dias em que os teus inimigos te cercarão de
trincheiras, te sitiarão e te apertarão de todos os lados;
44. destruir-te-ão a ti e a teus filhos que estiverem dentro de
ti, e não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não conheceste o
tempo em que foste visitada.
45. Em seguida, entrou no templo e começou a expulsar os
mercadores.
46. Disse ele: Está escrito: A minha casa é casa de oração! Mas
vós a fizestes um covil de ladrões (Is 56,7; Jr 7,11).
47. Todos os dias ensinava no templo. Os príncipes dos
sacerdotes, porém, os escribas e os chefes do povo procuravam tirar-lhe
a vida.
48. Mas não sabiam como realizá-lo, porque todo o povo ficava
suspenso de admiração, quando o ouvia falar.
Capítulo 20
1. Num daqueles dias, Jesus ensinava no templo e anunciava ao
povo a boa nova. Chegaram os príncipes dos sacerdotes e os escribas com
os anciãos,
2. e falaram-lhe: Dize-nos: com que direito fazes essas coisas,
ou quem é que te deu essa autoridade?
3. Jesus respondeu: Também eu vos farei uma pergunta.
4. Respondei-me: o batismo de João era do céu ou dos homens?
5. Eles começaram a raciocinar entre si, dizendo: Se dissermos:
Do céu, ele dirá: Por que razão, pois, não crestes nele?
6. Se, porém, dissermos: Dos homens, todo o povo nos apedrejará,
porque está convencido de que João era profeta.
7. Responderam por fim que não sabiam de onde era.
8. Replicou-lhes também Jesus: Nem eu vos direi com que direito
faço estas coisas.
9. Então Jesus propôs-lhes esta parábola: Um homem plantou uma
vinha, arrendou-a a vinhateiros e ausentou-se por muito tempo para uma
terra estranha.
10. No tempo da colheita, enviou um servo aos vinhateiros para
que lhe dessem do produto da vinha. Estes o feriram e o reenviaram de
mãos vazias.
11. Tornou a enviar outro servo; eles feriram também a este,
ultrajaram-no e despediram-no sem coisa alguma.
12. Tornou a enviar um terceiro; feriram também este e
expulsaram-no.
13. Disse então o senhor da vinha: Que farei? Mandarei meu filho
amado; talvez o respeitem.
14. Vendo-o, porém, os vinhateiros discorriam entre si e diziam:
Este é o herdeiro; matemo-lo, para que se torne nossa a herança.
15. E lançaram-no fora da vinha e mataram-no. Que lhes fará,
pois, o dono da vinha?
16. Virá e exterminará estes vinhateiros e dará a vinha a outros.
A estas palavras, disseram: Que Deus não o permita!
17. Mas Jesus, fixando o olhar neles, disse-lhes: Que quer dizer
então o que está escrito: A pedra que os edificadores rejeitaram
tornou-se a pedra angular (Sl 117,22)?
18. Todo o que cair sobre esta pedra ficará despedaçado; e sobre
quem ela cair, este será esmagado!
19. Naquela mesma hora os príncipes dos sacerdotes e os escribas
procuraram prendê-lo, mas temeram o povo. Tinham compreendido que se
referia a eles ao propor essa parábola.
20. Puseram-se então a observá-lo e mandaram espiões que se
disfarçassem em homens de bem, para armar-lhe ciladas e surpreendê-lo no
que dizia, a fim de o entregarem à autoridade e ao poder do governador.
21. Perguntaram-lhe eles: Mestre, sabemos que falas e ensinas com
retidão e que, sem fazer acepção de pessoa alguma, ensinas o caminho de
Deus segundo a verdade.
22. É-nos permitido pagar o imposto ao imperador ou não?
23. Jesus percebeu a astúcia e respondeu-lhes:
24. Mostrai-me um denário. De quem leva a imagem e a inscrição?
Responderam: De César.
25. Então lhes disse: Dai, pois, a César o que é de César e a
Deus o que é de Deus.
26. Assim não puderam surpreendê-lo em nenhuma de suas palavras
diante do povo. Pelo contrário, admirados da sua resposta, tiveram que
calar-se.
27. Alguns saduceus - que negam a ressurreição - aproximaram-se
de Jesus e perguntaram-lhe:
28. Mestre, Moisés prescreveu-nos: Se alguém morrer e deixar
mulher, mas não deixar filhos, case-se com ela o irmão dele, e dê
descendência a seu irmão.
29. Ora, havia sete irmãos, o primeiro dos quais tomou uma
mulher, mas morreu sem filhos.
30. Casou-se com ela o segundo, mas também ele morreu sem filhos.
31. Casou-se depois com ela o terceiro. E assim sucessivamente
todos os sete, que morreram sem deixar filhos.
32. Por fim, morreu também a mulher.
33. Na ressurreição, de qual deles será a mulher? Porque os sete
a tiveram por mulher.
34. Jesus respondeu: Os filhos deste mundo casam-se e dão-se em
casamento,
35. mas os que serão julgados dignos do século futuro e da
ressurreição dos mortos não terão mulher nem marido.
36. Eles jamais poderão morrer, porque são iguais aos anjos e são
filhos de Deus, porque são ressuscitados.
37. Por outra parte, que os mortos hão de ressuscitar é o que
Moisés revelou na passagem da sarça ardente (Ex 3,6), chamando ao
Senhor: Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó .
38. Ora, Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos; porque todos
vivem para ele.
39. Alguns dos escribas disseram, então: Mestre, falaste bem.
40. E já não se atreviam a fazer-lhe pergunta alguma.
41. Jesus perguntou-lhes: Como se pode dizer que Cristo é filho
de Davi?
42. Pois o próprio Davi, no livro dos Salmos, diz: Disse o Senhor
a meu Senhor: Senta-te à minha direita,
43. até que eu ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés
(Sl 109,1).
44. Portanto, Davi o chama de Senhor! Como, pois, é ele seu
filho?
45. Enquanto todo o povo o ouvia, disse a seus discípulos:
46. Guardai-vos dos escribas, que querem andar de roupas
compridas e gostam das saudações nas praças públicas, das primeiras
cadeiras nas sinagogas e dos primeiros lugares dos banquetes;
47. que devoram as casas das viúvas, fingindo fazer longas
orações. Eles receberão castigo mais rigoroso.
Capítulo 21
1. Levantando os olhos, viu Jesus os ricos que deitavam as suas
ofertas no cofre do templo.
2. Viu também uma viúva pobrezinha deitar duas pequeninas moedas,
3. e disse: Em verdade vos digo: esta pobre viúva pôs mais do que
os outros.
4. Pois todos aqueles lançaram nas ofertas de Deus o que lhes
sobra; esta, porém, deu, da sua indigência, tudo o que lhe restava para
o sustento.
5. Como lhe chamassem a atenção para a construção do templo feito
de belas pedras e recamado de ricos donativos, Jesus disse:
6. Dias virão em que destas coisas que vedes não ficará pedra
sobre pedra: tudo será destruído.
7. Então o interrogaram: Mestre, quando acontecerá isso? E que
sinal haverá para saber-se que isso se vai cumprir?
8. Jesus respondeu: Vede que não sejais enganados. Muitos virão
em meu nome, dizendo: Sou eu; e ainda: O tempo está próximo. Não sigais
após eles.
9. Quando ouvirdes falar de guerras e de tumultos, não vos
assusteis; porque é necessário que isso aconteça primeiro, mas não virá
logo o fim.
10. Disse-lhes também: Levantar-se-ão nação contra nação e reino
contra reino.
11. Haverá grandes terremotos por várias partes, fomes e pestes,
e aparecerão fenômenos espantosos no céu.
12. Mas, antes de tudo isso, vos lançarão as mãos e vos
perseguirão, entregando-vos às sinagogas e aos cárceres, levando-vos à
presença dos reis e dos governadores, por causa de mim.
13. Isto vos acontecerá para que vos sirva de testemunho.
14. Gravai bem no vosso espírito de não preparar vossa defesa,
15. porque eu vos darei uma palavra cheia de sabedoria, à qual
não poderão resistir nem contradizer os vossos adversários.
16. Sereis entregues até por vossos pais, vossos irmãos, vossos
parentes e vossos amigos, e matarão muitos de vós.
17. Sereis odiados por todos por causa do meu nome.
18. Entretanto, não se perderá um só cabelo da vossa cabeça.
19. É pela vossa constância que alcançareis a vossa salvação.
20. Quando virdes que Jerusalém foi sitiada por exércitos, então
sabereis que está próxima a sua ruína.
21. Os que então se acharem na Judéia fujam para os montes; os
que estiverem dentro da cidade retirem-se; os que estiverem nos campos
não entrem na cidade.
22. Porque estes serão dias de castigo, para que se cumpra tudo o
que está escrito.
23. Ai das mulheres que, naqueles dias, estiverem grávidas ou
amamentando, pois haverá grande angústia na terra e grande ira contra o
povo.
24. Cairão ao fio de espada e serão levados cativos para todas as
nações, e Jerusalém será pisada pelos pagãos, até se completarem os
tempos das nações pagãs.
25. Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra a
aflição e a angústia apoderar-se-ão das nações pelo bramido do mar e das
ondas.
26. Os homens definharão de medo, na expectativa dos males que
devem sobrevir a toda a terra. As próprias forças dos céus serão
abaladas.
27. Então verão o Filho do Homem vir sobre uma nuvem com grande
glória e majestade.
28. Quando começarem a acontecer estas coisas, reanimai-vos e
levantai as vossas cabeças; porque se aproxima a vossa libertação.
29. Acrescentou ainda esta comparação: Olhai para a figueira e
para as demais árvores.
30. Quando elas lançam os brotos, vós julgais que está perto o
verão.
31. Assim também, quando virdes que vão sucedendo estas coisas,
sabereis que está perto o Reino de Deus.
32. Em verdade vos declaro: não passará esta geração sem que tudo
isto se cumpra.
33. Passarão o céu e a terra, mas as minhas palavras não
passarão.
34. Velai sobre vós mesmos, para que os vossos corações não se
tornem pesados com o excesso do comer, com a embriaguez e com as
preocupações da vida; para que aquele dia não vos apanhe de improviso.
35. Como um laço cairá sobre aqueles que habitam a face de toda a
terra.
36. Vigiai, pois, em todo o tempo e orai, a fim de que vos
torneis dignos de escapar a todos estes males que hão de acontecer, e de
vos apresentar de pé diante do Filho do Homem.
37. Durante o dia Jesus ensinava no templo e, à tarde, saía para
passar a noite no monte chamado das Oliveiras.
38. E todo o povo ia de manhã cedo ter com ele, no templo, para
ouvi-lo.
Capítulo 22
1. Aproximava-se a festa dos pães sem fermento, chamada Páscoa.
2. Os príncipes dos sacerdotes e os escribas buscavam um meio de
matar Jesus, mas temiam o povo.
3. Entretanto, Satanás entrou em Judas, que tinha por sobrenome
Iscariotes, um dos Doze.
4. Judas foi procurar os príncipes dos sacerdotes e os oficiais
para se entender com eles sobre o modo de lho entregar.
5. Eles se alegraram com isso, e concordaram em lhe dar dinheiro.
6. Também ele se obrigou. E buscava ocasião oportuna para o
trair, sem que a multidão o soubesse.
7. Raiou o dia dos pães sem fermento, em que se devia imolar a
Páscoa.
8. Jesus enviou Pedro e João, dizendo: Ide e preparai-nos a ceia
da Páscoa.
9. Perguntaram-lhe eles: Onde queres que a preparemos?
10. Ele respondeu: Ao entrardes na cidade, encontrareis um homem
carregando uma bilha de água; segui-o até a casa em que ele entrar,
11. e direis ao dono da casa: O Mestre pergunta-te: Onde está a
sala em que comerei a Páscoa com os meus discípulos?
12. Ele vos mostrará no andar superior uma grande sala mobiliada,
e ali fazei os preparativos.
13. Foram, pois, e acharam tudo como Jesus lhes dissera; e
prepararam a Páscoa.
14. Chegada que foi a hora, Jesus pôs-se à mesa, e com ele os
apóstolos.
15. Disse-lhes: Tenho desejado ardentemente comer convosco esta
Páscoa, antes de sofrer.
16. Pois vos digo: não tornarei a comê-la, até que ela se cumpra
no Reino de Deus.
17. Pegando o cálice, deu graças e disse: Tomai este cálice e
distribuí-o entre vós.
18. Pois vos digo: já não tornarei a beber do fruto da videira,
até que venha o Reino de Deus.
19. Tomou em seguida o pão e depois de ter dado graças, partiu-o
e deu-lho, dizendo: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto
em memória de mim.
20. Do mesmo modo tomou também o cálice, depois de cear, dizendo:
Este cálice é a Nova Aliança em meu sangue, que é derramado por vós...
21. Entretanto, eis que a mão de quem me trai está à mesa comigo.
22. O Filho do Homem vai, segundo o que está determinado, mas ai
daquele homem por quem ele é traído!
23. Perguntavam então os discípulos entre si quem deles seria o
que tal haveria de fazer.
24. Surgiu também entre eles uma discussão: qual deles seria o
maior.
25. E Jesus disse-lhes: Os reis dos pagãos dominam como senhores,
e os que exercem sobre eles autoridade chamam-se benfeitores.
26. Que não seja assim entre vós; mas o que entre vós é o maior,
torne-se como o último; e o que governa seja como o servo.
27. Pois qual é o maior: o que está sentado à mesa ou o que
serve? Não é aquele que está sentado à mesa? Todavia, eu estou no meio
de vós, como aquele que serve.
28. E vós tendes permanecido comigo nas minhas provações;
29. eu, pois, disponho do Reino a vosso favor, assim como meu Pai
o dispôs a meu favor,
30. para que comais e bebais à minha mesa no meu Reino e vos
senteis em tronos, para julgar as doze tribos de Israel.
31. Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar
como o trigo;
32. mas eu roguei por ti, para que a tua confiança não desfaleça;
e tu, por tua vez, confirma os teus irmãos.
33. Pedro disse-lhe: Senhor, estou pronto a ir contigo tanto para
a prisão como para a morte.
34. Jesus respondeu-lhe: Digo-te, Pedro, não cantará hoje o galo,
até que três vezes hajas negado que me conheces.
35. Depois ajuntou: Quando vos mandei sem bolsa, sem mochila e
sem calçado, faltou-vos porventura alguma coisa? Eles responderam: Nada.
36. Mas agora, disse-lhes ele, aquele que tem uma bolsa, tome-a;
aquele que tem uma mochila, tome-a igualmente; e aquele que não tiver
uma espada, venda sua capa para comprar uma.
37. Pois vos digo: é necessário que se cumpra em mim ainda este
oráculo: E foi contado entre os malfeitores (Is 53,12). Com efeito,
aquilo que me diz respeito está próximo de se cumprir.
38. Eles replicaram: Senhor, eis aqui duas espadas. Basta,
respondeu ele.
39. Conforme o seu costume, Jesus saiu dali e dirigiu-se para o
monte das Oliveiras, seguido dos seus discípulos.
40. Ao chegar àquele lugar, disse-lhes: Orai para que não caiais
em tentação.
41. Depois se afastou deles à distância de um tiro de pedra e,
ajoelhando-se, orava:
42. Pai, se é de teu agrado, afasta de mim este cálice! Não se
faça, todavia, a minha vontade, mas sim a tua.
43. Apareceu-lhe então um anjo do céu para confortá-lo.
44. Ele entrou em agonia e orava ainda com mais instância, e seu
suor tornou-se como gotas de sangue a escorrer pela terra.
45. Depois de ter rezado, levantou-se, foi ter com os discípulos
e achou-os adormecidos de tristeza.
46. Disse-lhes: Por que dormis? Levantai-vos, orai, para não
cairdes em tentação.
47. Ele ainda falava, quando apareceu uma multidão de gente; e à
testa deles vinha um dos Doze, que se chamava Judas. Achegou-se de Jesus
para o beijar.
48. Jesus perguntou-lhe: Judas, com um beijo trais o Filho do
Homem!
49. Os que estavam ao redor dele, vendo o que ia acontecer,
perguntaram: Senhor, devemos atacá-los à espada?
50. E um deles feriu o servo do príncipe dos sacerdotes,
decepando-lhe a orelha direita.
51. Mas Jesus interveio: Deixai, basta. E, tocando na orelha
daquele homem, curou-o.
52. Voltando-se para os príncipes dos sacerdotes, para os
oficiais do templo e para os anciãos que tinham vindo contra ele,
disse-lhes: Saístes armados de espadas e cacetes, como se viésseis
contra um ladrão.
53. Entretanto, eu estava todos os dias convosco no templo, e não
estendestes as mãos contra mim; mas esta é a vossa hora e do poder das
trevas.
54. Prenderam-no então e conduziram-no à casa do príncipe dos
sacerdotes. Pedro seguia-o de longe.
55. Acenderam um fogo no meio do pátio, e sentaram-se em redor.
Pedro veio sentar-se com eles.
56. Uma criada percebeu-o sentado junto ao fogo, encarou-o de
perto e disse: Também este homem estava com ele.
57. Mas ele negou-o: Mulher, não o conheço.
58. Pouco depois, viu-o outro e disse-lhe: Também tu és um deles.
Pedro respondeu: Não, eu não o sou.
59. Passada quase uma hora, afirmava um outro: Certamente também
este homem estava com ele, pois também é galileu.
60. Mas Pedro disse: Meu amigo, não sei o que queres dizer. E no
mesmo instante, quando ainda falava, cantou o galo.
61. Voltando-se o Senhor, olhou para Pedro. Então Pedro se
lembrou da palavra do Senhor: Hoje, antes que o galo cante, negar-me-ás
três vezes.
62. Saiu dali e chorou amargamente.
63. Entretanto, os homens que guardavam Jesus escarneciam dele e
davam-lhe bofetadas.
64. Cobriam-lhe o rosto e diziam: Adivinha quem te bateu!
65. E injuriavam-no ainda de outros modos.
66. Ao amanhecer, reuniram-se os anciãos do povo, os príncipes
dos sacerdotes e os escribas, e mandaram trazer Jesus ao seu conselho.
67. Perguntaram-lhe: Dize-nos se és o Cristo! Respondeu-lhes ele:
Se eu vo-lo disser, não me acreditareis;
68. e se vos fizer qualquer pergunta, não me respondereis.
69. Mas, doravante, o Filho do Homem estará sentado à direita do
poder de Deus.
70. Então perguntaram todos: Logo, tu és o Filho de Deus?
Respondeu: Sim, eu sou.
71. Eles então exclamaram: Temos nós ainda necessidade de
testemunho? Nós mesmos o ouvimos da sua boca.
Capítulo 23
1. Levantou-se a sessão e conduziram Jesus diante de Pilatos,
2. e puseram-se a acusá-lo: Temos encontrado este homem excitando
o povo à revolta, proibindo pagar imposto ao imperador e dizendo-se
Messias e rei.
3. Pilatos perguntou-lhe: És tu o rei dos judeus? Jesus
respondeu: Sim.
4. Declarou Pilatos aos príncipes dos sacerdotes e ao povo: Eu
não acho neste homem culpa alguma.
5. Mas eles insistiam fortemente: Ele revoluciona o povo
ensinando por toda a Judéia, a começar da Galiléia até aqui.
6. A estas palavras, Pilatos perguntou se ele era galileu.
7. E, quando soube que era da jurisdição de Herodes, enviou-o a
Herodes, pois justamente naqueles dias se achava em Jerusalém.
8. Herodes alegrou-se muito em ver Jesus, pois de longo tempo
desejava vê-lo, por ter ouvido falar dele muitas coisas, e esperava
presenciar algum milagre operado por ele.
9. Dirigiu-lhe muitas perguntas, mas Jesus nada respondeu.
10. Ali estavam os príncipes dos sacerdotes e os escribas,
acusando-o com violência.
11. Herodes, com a sua guarda, tratou-o com desprezo, escarneceu
dele, mandou revesti-lo de uma túnica branca e reenviou-o a Pilatos.
12. Naquele mesmo dia, Pilatos e Herodes fizeram as pazes, pois
antes eram inimigos um do outro.
13. Pilatos convocou então os príncipes dos sacerdotes, os
magistrados e o povo, e disse-lhes:
14. Apresentastes-me este homem como agitador do povo, mas,
interrogando-o eu diante de vós, não o achei culpado de nenhum dos
crimes de que o acusais.
15. Nem tampouco Herodes, pois no-lo devolveu. Portanto, ele nada
fez que mereça a morte.
16. Por isso, soltá-lo-ei depois de o castigar.
17. [Acontecia que em cada festa ele era obrigado a soltar-lhes
um preso.]
18. Todo o povo gritou a uma voz: À morte com este, e solta-nos
Barrabás.
19. (Este homem fora lançado ao cárcere devido a uma revolta
levantada na cidade, por causa de um homicídio.)
20. Pilatos, porém, querendo soltar Jesus, falou-lhes de novo,
21. mas eles vociferavam: Crucifica-o! Crucifica-o!
22. Pela terceira vez, Pilatos ainda interveio: Mas que mal fez
ele, então? Não achei nele nada que mereça a morte; irei, portanto,
castigá-lo e, depois, o soltarei.
23. Mas eles instavam, reclamando em altas vozes que fosse
crucificado, e os seus clamores recrudesciam.
24. Pilatos pronunciou então a sentença que lhes satisfazia o
desejo.
25. Soltou-lhes aquele que eles reclamavam e que havia sido
lançado ao cárcere por causa do homicídio e da revolta, e entregou Jesus
à vontade deles.
26. Enquanto o conduziam, detiveram um certo Simão de Cirene, que
voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para que a carregasse atrás de
Jesus.
27. Seguia-o uma grande multidão de povo e de mulheres, que
batiam no peito e o lamentavam.
28. Voltando-se para elas, Jesus disse: Filhas de Jerusalém, não
choreis sobre mim, mas chorai sobre vós mesmas e sobre vossos filhos.
29. Porque virão dias em que se dirá: Felizes as estéreis, os
ventres que não geraram e os peitos que não amamentaram!
30. Então dirão aos montes: Caí sobre nós! E aos outeiros:
Cobri-nos!
31. Porque, se eles fazem isto ao lenho verde, que acontecerá ao
seco?
32. Eram conduzidos ao mesmo tempo dois malfeitores para serem
mortos com Jesus.
33. Chegados que foram ao lugar chamado Calvário, ali o
crucificaram, como também os ladrões, um à direita e outro à esquerda.
34. E Jesus dizia: Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que
fazem. Eles dividiram as suas vestes e as sortearam.
35. A multidão conservava-se lá e observava. Os príncipes dos
sacerdotes escarneciam de Jesus, dizendo: Salvou a outros, que se salve
a si próprio, se é o Cristo, o escolhido de Deus!
36. Do mesmo modo zombavam dele os soldados. Aproximavam-se dele,
ofereciam-lhe vinagre e diziam:
37. Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo.
38. Por cima de sua cabeça pendia esta inscrição: Este é o rei
dos judeus.
39. Um dos malfeitores, ali crucificados, blasfemava contra ele:
Se és o Cristo, salva-te a ti mesmo e salva-nos a nós!
40. Mas o outro o repreendeu: Nem sequer temes a Deus, tu que
sofres no mesmo suplício?
41. Para nós isto é justo: recebemos o que mereceram os nossos
crimes, mas este não fez mal algum.
42. E acrescentou: Jesus, lembra-te de mim, quando tiveres
entrado no teu Reino!
43. Jesus respondeu-lhe: Em verdade te digo: hoje estarás comigo
no paraíso.
44. Era quase à hora sexta e em toda a terra houve trevas até a
hora nona.
45. Escureceu-se o sol e o véu do templo rasgou-se pelo meio.
46. Jesus deu então um grande brado e disse: Pai, nas tuas mãos
entrego o meu espírito. E, dizendo isso, expirou.
47. Vendo o centurião o que acontecia, deu glória a Deus e disse:
Na verdade, este homem era um justo.
48. E toda a multidão dos que assistiam a este espetáculo e viam
o que se passava, voltou batendo no peito.
49. Os amigos de Jesus, como também as mulheres que o tinham
seguido desde a Galiléia, conservavam-se a certa distância, e observavam
estas coisas.
50. Havia um homem, por nome José, membro do conselho, homem reto
e justo.
51. Ele não havia concordado com a decisão dos outros nem com os
atos deles. Originário de Arimatéia, cidade da Judéia, esperava ele o
Reino de Deus.
52. Foi ter com Pilatos e lhe pediu o corpo de Jesus.
53. Ele o desceu da cruz, envolveu-o num pano de linho e
colocou-o num sepulcro, escavado na rocha, onde ainda ninguém havia sido
depositado.
54. Era o dia da Preparação e já ia principiar o sábado.
55. As mulheres, que tinham vindo com Jesus da Galiléia,
acompanharam José. Elas viram o túmulo e o modo como o corpo de Jesus
ali fora depositado.
56. Elas voltaram e prepararam aromas e bálsamos. No dia de
sábado, observaram o preceito do repouso.
Capítulo 24
1. No primeiro dia da semana, muito cedo, dirigiram-se ao
sepulcro com os aromas que haviam preparado.
2. Acharam a pedra removida longe da abertura do sepulcro.
3. Entraram, mas não encontraram o corpo do Senhor Jesus.
4. Não sabiam elas o que pensar, quando apareceram em frente
delas dois personagens com vestes resplandecentes.
5. Como estivessem amedrontadas e voltassem o rosto para o chão,
disseram-lhes eles: Por que buscais entre os mortos aquele que está
vivo?
6. Não está aqui, mas ressuscitou. Lembrai-vos de como ele vos
disse, quando ainda estava na Galiléia:
7. O Filho do Homem deve ser entregue nas mãos dos pecadores e
crucificado, mas ressuscitará ao terceiro dia.
8. Então elas se lembraram das palavras de Jesus.
9. Voltando do sepulcro, contaram tudo isso aos Onze e a todos os
demais.
10. Eram elas Maria Madalena, Joana e Maria, mãe de Tiago; as
outras suas amigas relataram aos apóstolos a mesma coisa.
11. Mas essas notícias pareciam-lhes como um delírio, e não lhes
deram crédito.
12. Contudo, Pedro correu ao sepulcro; inclinando-se para olhar,
viu só os panos de linho na terra. Depois, retirou-se para a sua casa,
admirado do que acontecera.
13. Nesse mesmo dia, dois discípulos caminhavam para uma aldeia
chamada Emaús, distante de Jerusalém sessenta estádios.
14. Iam falando um com o outro de tudo o que se tinha passado.
15. Enquanto iam conversando e discorrendo entre si, o mesmo
Jesus aproximou-se deles e caminhava com eles.
16. Mas os olhos estavam-lhes como que vendados e não o
reconheceram.
17. Perguntou-lhes, então: De que estais falando pelo caminho, e
por que estais tristes?
18. Um deles, chamado Cléofas, respondeu-lhe: És tu acaso o único
forasteiro em Jerusalém que não sabe o que nela aconteceu estes dias?
19. Perguntou-lhes ele: Que foi? Disseram: A respeito de Jesus de
Nazaré... Era um profeta poderoso em obras e palavras, diante de Deus e
de todo o povo.
20. Os nossos sumos sacerdotes e os nossos magistrados o
entregaram para ser condenado à morte e o crucificaram.
21. Nós esperávamos que fosse ele quem havia de restaurar Israel
e agora, além de tudo isto, é hoje o terceiro dia que essas coisas
sucederam.
22. É verdade que algumas mulheres dentre nós nos alarmaram. Elas
foram ao sepulcro, antes do nascer do sol;
23. e não tendo achado o seu corpo, voltaram, dizendo que tiveram
uma visão de anjos, os quais asseguravam que está vivo.
24. Alguns dos nossos foram ao sepulcro e acharam assim como as
mulheres tinham dito, mas a ele mesmo não viram.
25. Jesus lhes disse: Ó gente sem inteligência! Como sois tardos
de coração para crerdes em tudo o que anunciaram os profetas!
26. Porventura não era necessário que Cristo sofresse essas
coisas e assim entrasse na sua glória?
27. E começando por Moisés, percorrendo todos os profetas,
explicava-lhes o que dele se achava dito em todas as Escrituras.
28. Aproximaram-se da aldeia para onde iam e ele fez como se
quisesse passar adiante.
29. Mas eles forçaram-no a parar: Fica conosco, já é tarde e já
declina o dia. Entrou então com eles.
30. Aconteceu que, estando sentado conjuntamente à mesa, ele
tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e serviu-lho.
31. Então se lhes abriram os olhos e o reconheceram... mas ele
desapareceu.
32. Diziam então um para o outro: Não se nos abrasava o coração,
quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?
33. Levantaram-se na mesma hora e voltaram a Jerusalém. Aí
acharam reunidos os Onze e os que com eles estavam.
34. Todos diziam: O Senhor ressuscitou verdadeiramente e apareceu
a Simão.
35. Eles, por sua parte, contaram o que lhes havia acontecido no
caminho e como o tinham reconhecido ao partir o pão.
36. Enquanto ainda falavam dessas coisas, Jesus apresentou-se no
meio deles e disse-lhes: A paz esteja convosco!
37. Perturbados e espantados, pensaram estar vendo um espírito.
38. Mas ele lhes disse: Por que estais perturbados, e por que
essas dúvidas nos vossos corações?
39. Vede minhas mãos e meus pés, sou eu mesmo; apalpai e vede: um
espírito não tem carne nem ossos, como vedes que tenho.
40. E, dizendo isso, mostrou-lhes as mãos e os pés.
41. Mas, vacilando eles ainda e estando transportados de alegria,
perguntou: Tendes aqui alguma coisa para comer?
42. Então ofereceram-lhe um pedaço de peixe assado.
43. Ele tomou e comeu à vista deles.
44. Depois lhes disse: Isto é o que vos dizia quando ainda estava
convosco: era necessário que se cumprisse tudo o que de mim está escrito
na Lei de Moisés, nos profetas e nos Salmos.
45. Abriu-lhes então o espírito, para que compreendessem as
Escrituras, dizendo:
46. Assim é que está escrito, e assim era necessário que Cristo
padecesse, mas que ressurgisse dos mortos ao terceiro dia.
47. E que em seu nome se pregasse a penitência e a remissão dos
pecados a todas as nações, começando por Jerusalém.
48. Vós sois as testemunhas de tudo isso.
49. Eu vos mandarei o Prometido de meu Pai; entretanto,
permanecei na cidade, até que sejais revestidos da força do alto.
50. Depois os levou para Betânia e, levantando as mãos, os
abençoou.
51. Enquanto os abençoava, separou-se deles e foi arrebatado ao
céu.
52. Depois de o terem adorado, voltaram para Jerusalém com grande
júbilo.
53. E permaneciam no templo, louvando e bendizendo a Deus.
|
|
|